quinta-feira, 5 de janeiro de 2006

India: evite, se puder

Nova Déli, Jaipur, Agra, Khajuraho e Varanasi. Para minha saúde física e mental, é o bastante. A civilização hindi não convence. Suas cidades parecem ter recém-saído de uma guerra e um terremoto, simultâneos e arrazadores. Em toda parte, ruínas, devastação e miséria. Nada se salva. Nada pode ser feliz num país que cambaleia no limiar da fome e da morte. O hinduísmo reivindica muitos achados religiosos, mas ajudou a guiar a India a uma permanente hecatombe. (Alguém disse - acho que foi o Júlio - que o filme Mad Max poderia ser filmado na India, sem o artificialismo de cenários. Discordo. A India precisaria melhorar substancialmente para poder retratar, sem sustos, um mundo pós-hecatombe nuclear). 1.000.000.000 de famintos, morrendo entre vacas, porcos e macacos nutridos, mas intocáveis. Jurado de morte, o hindu existe, copioso. Para quê? No caminho entre Déli e Jaipur vi silhuetas de prédios corporativos em construção. O fog e a miséria do entorno conspiravam para fazer-me ver fantasmas bruxuleantes, que ardiam por entre esqueletos de futuras sedes de negócios. Não entendo os hindus. Após alguns dias em sua companhia, talvez não queira. Sua horrenda escalada no subcontinente não os favorece. A densa trama de pessoas desarvoradas compõe um quadro de repulsiva repetição. Na India, não há chance para o homem. Viver com menos de um dolar por dia. Há um sofisma irredutível nessa frase, que remete diretamente às mansões da morte. Alguns vêm à India para confirmar suas fantasias místicas. Plenos de fervor prévio, não enxergam o impossivel show de horrores que a Índia prodigaliza. Vacas disputando o lixo com mendigos; pessoas que fedem a urina e suor de meses; astutos porcos e patos esperando mendigos defecar para comer-lhes os excrementos. A civilização se contorce e produz sub-humanos. Não parece afetada pela dor que, impropriamente, sinto. Comerciantes, hotéis e empresas de turismo, todos respeitáveis, praticam respeitabilíssimos golpes contra seus clientes. Vendedores de qualquer coisa espreitam em cada esquina. Nuvens de indigentes se aglomeram a sua volta, varejam sua alma e dela extraem uma percentagem. Cada sagrada vaca injeta na atmosfera 600 litros/dia de metano, por meio de sagrados puns. Os indianos têm milhões de indolentes vacas, cheias de bernes, carrapatos e vermes. Após errarem pelas cidades, terminam carneadas por cachorros. Sua cozinha, um interminável desfile de migalhas de frango abusadas por pimentas ilícitas, completa o dissoluto quadro dessa civilização, que já foi mais bem representada. "Esta miséria", pensei, "é tão horrível que sua mera existência e perduração, embora no seio de uma civilização remota, contamina o passado e o futuro e, de algum modo, compromete os astros. Enquanto perdurar, ninguém no mundo poderá ser valoroso ou feliz". Déli, 5 de janeiro de 2006.

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