O quarto de hostel
No YHA de Queenstown, situado à beira do lago Wakatipu, tinha mochileiro saindo pelo ladrão. Um americano (morador do Alasca, não apurei seu nome) exasperou-se com a poluição do quarto, lotado. Certa manhã, vi-o passar sonora descompostura nos dois irmãos japoneses responsáveis por metade dessa poluição, segundo a todos parecia.
Toda noite tinha lugar um concerto de roncos, silvos, chiados e outros barulhos inclassificáveis, secundados por um ocasional e malsão ruído culpado (um sujeito alternava roncos, em tons de tenor, com outros estribilhos, em baixos mais fundos, numa sinfonia entristecedora).
O americano determinou que dali em diante as janelas ficariam abertas, noite inteira, não importava quantos carros liquidassem suas baterias em apitos; quantas chuvas tivessem vontade de chover. Ele solicitou o apoio do Brasil, cuja diplomacia acedeu de imediato. Mesmo as duras medidas contra os asiáticos (também ocorriam chineses no quarto, prontamente inculpados de envenenar o ar) foram ratificadas, o que colocou em movimento a diplomacia francesa.
Quando saí, para Milford Sound, uns e outros se mandavam acaloradamente ao inferno. Numa coisa o americano tinha razão: a continuar aquele nível de emissão de gases, já já o planeta estaria debaixo d’água.
Não sei como as coisas evoluíram depois dessa profilaxia. Sentindo o pulso do mundo, evadi-me, antes que o quarto explodisse.
Queenstown, janeiro de 2005.