sábado, 26 de novembro de 2005

Sábado

Termino agora a leitura do jornal. Marcelo Rubens Paiva, criticando o sensacionalismo da imprensa com as supostas revoluções da medicina, e particularmente a Veja, nos brinda com a seguinte manchete de uma revista:

Síndrome do intestino instável, sons e movimentos estranhos podem ser sinais desta doença.

E a pergunta: "Por que você está rindo?"

Ele ainda se lembra (e eu também) de quando Cid Moreira (sim, o Cid) anunciava, a intervalos previsíveis, a cura do câncer. Depois essas curas passaram a ser feitas com plantas da amazônia. Não é bacana, leitor?

Marcelo reclama, ainda, do inefável Dr. Fritz. Putz! Não suporto quem fala mal do Fritz.

Em suas reiteradas encarnações, Fritz cura muita gente, que costuma retribuir com a ingratidão de algumas facadas. Até aquele sotaque, tirante a novela da Globo, me encantava. Wanessa Camargo foi curada numa dessas "cirurgias espirituais", alardeia outro magazine, o que mais e mais prova que os céticos são mesmo uns chatos mal-informados.

Dizia eu, em algum despacho (foi o Josias que inventou essa de despacho. De onde ele tirou essa maluquice?) que acredito em mula-sem-cabeça. É verdade.

Em realidade as mulas, da espécie sem cabeça, são uma forte presença em nossa ricamente ilustrada nação. E não passa um dia sem que eu me convença, cada vez com mais fervor, da inocência do Dirceu.

Espero que tanta inocência sirva de reflexão para o STF.

domingo, 20 de novembro de 2005

O presidente e o vidente

Esta é uma história de um presidente (qualquer um, o leitor escolhe). Ele acredita em videntes. 

Todos nós, que vivemos a Era Paulo Coelho, acreditamos em videntes. E também em elfos, duendes, fadas e anões de jardim. Declaro acreditar, não sem fervor, em mula-sem-cabeça. 

Mesmo assim alguns insensatos, por vezes, não acreditam no COPOM (órgão extraconstitucional com destacada atuação extralegal), o que é deplorável. Desacatam os inefáveis monges do Comitê de Política Econômica, que mensalmente se reúnem numa missa negra e transmitem os sinais da representação divina pelo gesto da igualmente divina elevação do cálice dos juros. 

Nas palavras do herege Paulo Rebello de Castro “quando a missa do Copom aponta uma alta de meio ponto percentual no já elevado cálice dos juros básicos, os fiéis suspiram resignados enquanto entoam, baixinho [bem baixinho], miserere nobis”.¹ 

Após almoçar com a diretoria do Banco Central (inteiramente composta de duendes), o presidente vai ao amigo vidente e pergunta o que ele vê em seu futuro. O vidente se concentra (ele realmente se concentra, leitor), fecha os olhos (que abrifecham, tremurados, cheios de temor e reverência), e fala: 

– Vejo o senhor passando no Eixo Monumental, em carro aberto, e uma multidão agitada, acenando. O presidente sorri e pergunta, ansioso: 

– Essa multidão que você vê, ela está feliz, não é mesmo? 

– Se ela está feliz! Ela chora de felicidade! Nem é lícito tentar descrever tamanho estoque de felicidade num só lugar. O presidente se entusiasma e, estreitando-se ao amigo, pergunta: 

– Eles estão correndo atrás do carro? 

– Ora quanta modéstia! Eles correm feito possessos atrás do carro, e ficam à sua volta. Os batedores estão tendo dificuldades em abrir caminho e, por trás dos óculos escuros e do semblante marcial a que são obrigados, também choram de felicidade cívica. 

– Eles carregam bandeiras? – Se carregam bandeiras! Ele quer saber se eles carregam bandeiras! Eles praticamente esgotaram o estoque de bandeiras do País e faixas com palavras de esperança e de um futuro muito em breve melhor. 

– E eles gritam, cantam, os dessa multidão? – Se eles gritam e cantam! Essa é muito boa! Eles irrompem em ondas espontâneas de euforia e entusiasmo, com erupções como "Agora sim!! Agora vai melhorar!!! Sem medo de ser feliz!!!" 

– E eu estou acenando de volta para eles? 

– Não. 

– Mas como, não? 

– O caixão está lacrado, oras bolas! 

Como o leitor já percebeu, essa historinha não é minha. Recolhi-a na rede e, por mais encantadora que seja, sinto que não sou responsável por ela. ¹ [Folha de São Paulo, 27.10.2004, p. B-2)