sábado, 30 de dezembro de 2006

Ainda Bali

Saí do mercado com algumas cervejas, chocolates e uma massa amarela que julguei ser a fruta-pão, sei lá por quê. Seu sabor é incomparável, e o seu cheiro, intolerável. Em decisão unânime, as moças do caixa aprovaram a compra. Macia e tenra, a massa se perde nas papilas; sabor e textura de outro mundo. O cheiro pode ser decomposto em duas partes: uma eu não saberia descrever; a outra sabe a benzeno. Agora que estou de volta à internet, esperem novidades. Hoje, um vulcão às 3 da manhã, depois, o maior templo de Bali. Ontem, cemitério indígena. Mortos aparentes e caveiras por toda parte. Em grande demonstração de indelicadeza, quase pisei o crânio de um cavalheiro (ou de uma dama, não sei).

quinta-feira, 28 de dezembro de 2006

Bali

Finalmente, internet! É uma empresa irregular e incerta a manutenção de uma página, em viagem. O acesso se dá em "janelas de oportunidade" imprevisíveis. Podemos passar dias sem conseguir ler a própria página e, depois, no mesmo lugar, disparar mensagens sem dó nem piedade. Seja como for, com o blog a viagem tem dois lados: o externo, exótico, e o mundo dos amigos, que me visitam. Ubud estava sem comunicação desde terça, para meu desconforto.

sábado, 23 de dezembro de 2006

Aos amigos

É uma alegria ler os comentários dos amigos, neste espaço. Embora só eventualmente eu consiga ler, e também escrever, fato é que a viagem se torna mais humana e divertida com a intervenção de vocês. Passei a noite num vagao de trem, a caminho desta cidade, Sa Pa, noroeste do Vietnã, quase fronteira com a China (uma fronteira que a China ignorou, em 1979, episódio amplamente desconhecido de todos nós). Sa Pa é uma vila alpina repleta de aldeões com trajes típicos, muito acolhedora e hiemal. Aqui estão as mais altas montanhas da Indochina, e o clima mais frio. Daqui a pouco vou conhecer uma aldeia, após uma lauta refeição a preços irrisórios. Forte abraço a todos.

domingo, 17 de dezembro de 2006

Hue

Estou em outra cidade, no centro montanhoso do Vietnã. O nome é desses pequeninos, e incertos. Passei pela Montanha da Chuva, de carro, com direito a vistas magníficas de praias lá embaixo. Estava chovendo (isso de nomes, eles levam a sério, por aqui). Daí cheguei nesta cidade, centro do império vietnamita durante várias dinastias (aposto que vocês nem sabiam que existiu um império vietnamita, não é mesmo?) Nem eu. Mas parece que existiu. E acabou somente em 1945 (o último imperador se refugiou em Paris, em 1960). Existe uma cidade proibida, muito muito parecida com a de Pequim, porém menos preservada (parece que uns americanos desocupados andaram bombardeando o lugar). Monumentos insuspeitados num Vietnã desconhecido. A propósito, estou sem acesso à página do blog, de forma que não posso ler os comentários dos corajosos leitores, embora possa escrever... Grande abraço.

sexta-feira, 15 de dezembro de 2006

Vietnã

Após dois dias de viagem, chego ao Vietnã. Ho Chi Minh (antiga Saigon) é a maior e mais importante cidade. É fervilhante, quase como as cidades da Índia, sem a mesma miséria. Nominalmente comunista, como a China, o Vietnã lê na mesma cartilha: progresso econômico acima de tudo. Ideologia vem depois, bem depois. Ho Chi Minh City teria 3 milhões de motos, segundo o guia. Sem qualquer filtro, cada moto emite gases equivalentes a vários carros, o que dá uma idéia da poluição desta cidade, de 6 milhões de agitados vietnamitas. De saias ou vestidos, as vietnamitas passeiam com fervor, de moto, e fazem a alegria dos turistas. Saigon, em breves linhas: 1. os melhores frutos do mar do mundo 2. um mar de motocas e magrelas 3. o delta do Mekong (não é tudo isso, não) 4. restaurantes que fecham 20:30, inclusive nos hotéis Hoje viajo para o norte, para novas aventuras. Ja falei dos frutos do mar?

domingo, 10 de dezembro de 2006

Pinochet, Fidel e outras aberrações

Morre o monstro chileno, após fatigar a infâmia. Outro genocida o seguirá, em breve. Vai ter festa no inferno nesse final de ano, ora se vai. Thatcher, cão de estimação de Reagan, lamentou-lhe a morte. A humanidade ainda não renunciou a seus basiliscos. Ao menos a natureza faz seu serviço.

quinta-feira, 9 de novembro de 2006

Três Lagoas

Às margens desse rio que aceita bem o nome Paraná, como depois consentirá o nome Uruguai, Três Lagoas preliba sua entrada na história. As lagoas fogem aos poucos, humilhadas pelas águas da barragem. A cidade ferve. Cidade ou promessa?

domingo, 5 de novembro de 2006

Notinhas

1. Diogo resolveu perseguir Moyses, o delegado de Piracicaba. Bem feito. Eles se merecem. Nessa história, só estranho as diáfanas declarações da procuradora da República que presenciou o vandalismo aos direitos constitucionais dos jornalistas.
Como um todo, a PF costuma ser eficaz, mas tem esses senões. Um doleiro entrou vivo e saiu morto de suas dependências, em São Paulo; no Rio, toneladas de cocaína e montes de dólares evaporaram de dentro da PF e, como era de se prever, nada aconteceu.
A procuradora diz que não houve nada de anormal. Acho que os profissionais da PF vão sofrer com a mídia. Moyses, a instituição, e seu chefe, podem vir a se arrepender de ter atraído sua ira.
Collor foi mais esperto (ou menos burro): escolheu apenas a Folha. Comeu o pão que o diabo desprezou. Não sei como alguém pode ser asno a ponto de achar que pode intimidar os titãs Folha, Estadão e Veja.
Evo, meu favorito: "Na Bolívia, há libertinagem de imprensa."
2. Hei, Lula, me dá uma refinaria aí?! Eu acho que mereço uma refinaria. Pode ser a Duque de Caxias, ou a de Paulínea. Você sabe que eu não seria ingrato, como aquele seu amigo Evo. E venderia gasolina bem baratinho, como seu amigo Chavez.
3. Sadam condenado à forca. Fascinante um tal Sadam: genocida, multibilionário, com uma pistola enferrujada e sem balas esperou em casa a chegada das legiões romanas.
Não confio num Sadam que enterra seus aviões, paralisa seus exércitos, espera o inimigo, mas não move um dedo para resistir-lhe, e aparece enterrado num buraco. Não se parece com o nosso Sadam, o carniceiro que exterminou milhões de iranianos e de iraquianos.
Mesmo Grace, a insondável personagem que Lars von Trier está construindo em sua devastadora trilogia, ora intérmina, não é páreo para "Sadam", genial personagem dessa impagável trinca de dramaturgos: Rover, Rummy e Cheney.
Sincronizaram a sentença para acontecer a algumas horas das eleições americans. Em teatro, tempo é tudo.
P.S.: Deu tudo errado. O povo não é tão burro assim...

segunda-feira, 30 de outubro de 2006

Candidatos

Dia seguinte à eleição, informam os jornais: Em Mato Grosso, "Ceguinho de Olho no Futuro" obteve 87 votos e não se elegeu deputado. Os eleitores também não se empolgaram com "Hélio Gaguinho" e "Claudinho Político Gago", de São Paulo. Nem com os mineiros "Edson Garganta" e "Gargantinha de Ouro".
O eleitorado rejeitou as promessas de "Quem-quem", do Piauí, "Alexandre Fala Sério", do Rio de Janeiro, "Bosco Faro Fino", de Rondônia, "Chiquinho Arara", do Acre, e "Boca da Verdade," de São Paulo." Lamento a rejeição de Ceguinho. Pergunto ao leitor, para reflexão ao ensejo das próximas eleições: quantos políticos podem dizer – honestamente, como é o caso – que estão de olho no futuro? Por que não elegê-lo? Estou bravo com esses eleitores, injustos. Concordo com eles quanto aos gaguinhos, uma gente que não tem mesmo de se meter em política, mas deploro não tenham eleito Fala Sério.
Um político tão bom!
Não entendo por que eleger o inverossímil Pudim, e rejeitar o bom Fala Sério, um político que só queria acabar com 500 anos de falas tortas “neztepaíz”.
Quanto a Faro Fino, Boca da Verdade, Chiquinho e, principalmente, Gargantinha de Ouro, não os conheço, mas é sempre prudente não eleger esses vadios. Quem-quem parece sofrer de uma vasta procura, e não conseguiu chegar a um consenso, por mínimo, sobre sua nobre pessoa. Eu jamais votaria nele, exceto para porteiro de auditório ou, quem sabe, agente funerário. Bussunda teria concordado com minhas observações, sem deixar de acrescentar: aê, fãããla séééério... Em tempos escrevi, num pós-eleição tão tranqüilo quanto este:
Vânia foi convocada para trabalhar no dia das eleições. Essas convocações são lindas, mas prevêem penalidades para quem não as atende com alegria. Vânia mencionou, algo desairosamente, que tramava apresentar uma declaração de incapacidade civil absoluta. "Vânia, irmã minha, considera um momento. Uma declaração dessas não comoveria o mais crédulo estagiário de cartório. Mesmo porque, se até alguns eleitos são loucos, por que diabos os mesários não o podem ser? Mal algum pode advir de acumular os cargos de louco e mesário, a não sermos preconceituosos." De qualquer forma, lembrei-lhe que costuma causar boa impressão o convocado que se apresenta portando um atestado de óbito. Aí sim a probabilidade de um parecer favorável, até do mais insensível chefe de cartório, a depender de seu humor e formação cristã. Parece que ela compreendeu. Após as eleições, mandei-lhe a seguinte mensagem: “Vânia: Observando o quadro de resultado das eleições, surpreendi-me refletindo sobre os candidatos de sua cidade, Teixeira de Freitas. O padre Apparecido, com todos os dois pês, mais os do PSDC e do padre, me pareceu uma escolha equivocada dos teixeirenses, por excessivamente plosiva.
Temoteo, nome que não concede um único i senão muito lá na frente, já nas instâncias do Alvis, me parecia uma escolha menos abafada. Baitakão, mais que um nome, é argumento de respeito, embora de ordem policial. Jamais votaria nele, a não ser para guarda de rua. Chamou-me a atenção o Tião do Detran: não estaria o Detran local fazendo uma concessão exagerada à sociedade, ao liberar semelhante criatura para a vereança? Muito mais acertada foi a escolha da Nalvinha, esta sim digna da nossa confiança e respeito. Você votou na Nalvinha, não é mesmo?. Mesmo que não o tenha feito, só me garanta que não votou em Nagibinho, pelo amor de Deus. É pessoa das mais respeitáveis, embora constrangedoramente propensa a reinações. De qualquer forma, não ousaria criticar a soberana decisão dos teixeirenses; até mesmo os votos em Nagibinho e Baitakão Que dizer a tantos e tão bons candidatos? Não, obrigado.” 7 de outubro de 2004 Vânia já não trabalha nas eleições. Não posso dizer o mesmo.

Deixa o homem vadiar!

Tendo escalado o gandula para a final, o PSDB conclui, com precisão, a manobra de eleger seu preferido. Aecinho simulou, junto com Tasso, dificuldades para Serra, que fugiu da raia, escaldado com o sensacional apoio recebido de seu partido em 2002.

Geraldo agradeceu o "apoio" da gente do Neves em Nevesland, e prepara sua entrada na história (como respeitável guarda-livros).

Anuncia-se que o novo "presidente" tem apoio de 17 governadores e 300 picaretas. Bobagem. Os presidentes recém-eleitos têm apoio de todos os governadores, e de quase todos os congressistas (ou Collor não teria incinerado o País com um canetaço).

Assim tão forte, temem que o "homem" delire, mandando um passaralho. Pra mim, o cara não vai longe, embora vá terminar, com certa tranquilidade, seu mandato, legal e democraticamente conquistado. A mini-constituinte à Evo tem a viabilidade do dólar boliviano. Apesar da ingênua e chorona oposição, o ciclo do petismo (sombria realidade em uma sociedade politicamente abúlica) termina mesmo em quatro anos.

domingo, 15 de outubro de 2006

Dicionário do Josias

Josias (de novo o Josias) aprontando:
Dicionários são as masmorras das palavras. Mas a língua é solta e a segurança é frágil. As prisioneiras por vezes escapam do cárcere. Uma vez em liberdade, buscam o disfarce de novos significados. De tempos em tempos, são recapturadas. E voltam ao calabouço de cara renovada. Vários nomes, vocábulos e siglas vagueiam pela cena eleitoral de 2006 à procura da máscara mais conveniente. Enquanto as algemas do dicionário não os alcançam, vai abaixo uma tentativa de desmascará-los: - Alckmin: uma calva à procura de idéias; - Aloprado: indivíduo que busca no birô de ‘inteligência’ de campanha um álibi para a falta de miolos; pilhado em flagrante, atinge a perfeição, tornando-se perfeito idiota; - Brasil: o insolúvel levado longe demais; - Corrupção: com um r providencialmente dobrado e um p que, embora mudo, não consegue ocultar o rabo do ç, sempre à mostra, é uma palavra cuja terminação, ão, denuncia o desejo de expansão; - Cristovam: uma idéia à procura de votos; - Democracia: regime tão maravilhosamente perfeito quanto qualquer outra mentira; sistema político cuja mobilidade permite a um operário atingir o auge da desfaçatez burguesa; - Excluído: fatalidade embutida no modelo; revolta que trocou o inconformismo pelo cartão do Bolsa Família; - Heloisa: camiseta branca, sem slogam; pessoa capaz de falat dez vezes antes de pensar; - Lula: Molusco cefalópode, dibranquiado, decápode, loliginídeo, de coloração avermelhada, podendo mudar de cor segundo a conveniência; em situações de perigo, perde o olfato e a visão; - Povo: fera de muitas cabeças que, quando bem adulada, lambe e balança o rabo; multidão obsoleta que, desavisada de sua própria inutilidade, continua se reproduzindo desordenadamente; - PMDB: organização partidária com fins lucrativos; - PFL: legenda que busca um casamento, em regime de comunhão de males, com qualquer outra que reúna condições de chegar ao poder;
- PSDB: um tipo de social-democrata que ambiciona voltar ao poder para complementar a execução do programa do PFL; - PSOL: espécie de galinha que promete pôr o Sol; esquerda que, não tendo ainda vencido na vida, não pôde virar direita; - PT: partido que abandonou a ideologia para cair na vida; - Programa: peça de campanha que anota coisas definitivas sem definir as coisas; - Reeleição: estatuto que faculta a um jóquei cego o direito de continuar cavalgando, por mais quatro anos, uma mula sem-cabeça; - Tucano: ave piciforme, ranfastídea, da qual há quatro espécies brasileiras reunidas no gênero Ramphastos e uma espécie que, organizada sob o gênero político, confere às demais uma péssima reputação. (Escrito por Josias de Souza às 22h58)
Escrevi, tempos atrás:
Releio os malditos poemas que dormem em mim enquanto eu velo meus poemas prestam-se ao pesadelo, vivem a um triz do desmanchar-se. Às vezes arrasto alguns comigo para uma alegre fogueirinha, como nos ensinou Borges. Às vezes, apresento-os a pessoas. O que as pessoas têm com meus devaneios? Eu deveria deixá-las em paz. Apraz-me incendiar o bom senso com minhas farsas poéticas com meus achaques literários minhas invenções rudes e baratas. Alguns poemas, cansados da longa espera, revoltam-se e tornam aos dicionários. Ficaram magoados com a lenta taxa de mutação – uma ou duas palavras a cada cinco anos –, e nenhuma edição. O público não merece meus poemas. Meus poemas não merecem o público. Então faço algumas reformas. Convoco novas palavras, escondo velhas fórmulas que finalmente confessaram seu esquematismo. Oculto antigos erros; exibo, orgulhoso, novos. Redivivem meus poemas, mas não serão publicados.
Rainer Maria Rilke: As obras de arte são de uma infinita solidão: nada as pode alcançar tão pouco quanto a crítica.

domingo, 8 de outubro de 2006

Política, política e mais política

Reinaldão, em seu furioso blog, desanca Mônica Bérgamo, que denunciou um acordo entre PT e PSDB para garantir a reeleição de Lula. Isto explicaria a repentina força do guarda-livros (conhecido por suas propensões alquimistas) dentro do PSDB.
Explicando meu ponto-de-vista:
1. Trabalhando com uma data (2010), a gente do Neves estimulou Serra a manter sua candidatura - natural - no tucanato. Ligava do Canadá todo dia pra ele.
2. Trabalhou ainda mais a cabeça do alquimista, dando-lhe toda a corda necessária para ameaçar Serra com uma suposta convenção. Sem entender que poderia ser sua última chance, Serra amarelou, abdicando de uma campanha árdua, em que seria entusiasticamente traído pelo dono do rancho Nevesland.
3. Tudo ia bem, mas o PT atuou poderosamente, jogando o sapo em sua atual lagoa de sal. Sem o PT-SP, há muito a fatura estaria liquidada.
4. A jogada interessante, de Aecinho, é que Serra não pode se empenhar na campanha do rival: Alquiminho só largaria o osso em 2014, quando Serra estaria com 72 anos, idade ingrata para um candidato. Assim, com Nevesland, Rio, Norte e Nordeste dominados, e Serra fazendo corpo mole (como Tasso e outros fizeram com ele em 2002), o sapão tem de ganhar a eleição.
Essa minha singela opinião (fácil, quando se tem pesquisas à mão).
Aecinho pode ir sondando o aluguel de um partido médio, para 2010 (pode consultar Collor, especialista em locação de legendas, se bem que pequenas).

sábado, 7 de outubro de 2006

2º turno

Anotei, abaixo, que Serra deve estar dividido quanto a apoiar o Magro. Um dado me fez mudar de opinião: em 2014 (data da próxima eleição disponível, caso eleito o Magro) Serra estará com 72 anos. Não há nada de errado em ter 72 anos, exceto se você for candidato à Presidência. Aecinho não apóia ninguém que não seja Aecinho, mas vai continuar fingindo em grande estilo. Apesar de seu "esforço heróico", não é difícil prever uma vitória de Lula de lavada em Nevesland. Meu palpite foi a vitória do tucano, não obstante sua campanha e amigos. Apesar dessa lagoa de sal em que o PT meteu seu sapo, talvez ele se saia bem. Mas também pode ser que o PT volte a atuar, e o guarda-livros seja agraciado com uma Presidência – meia-boca, convenhamos, mas, ainda assim, Presidência –. Nada mau.

quarta-feira, 4 de outubro de 2006

Urnas eletrônicas

Ubaldo Ribeiro disse, mais de uma vez, não confiar nas urnas eletrônicas brasileiras - "urnas americanas" -, nas quais nem os americanos confiariam.
Com seu jeito de ébrio humilde, Ubaldo conta com a boa vontade do leitor. Abusa, nesse caso.
Fisicamente falando, as urnas eletrônicas são um microcomputador, dos mais modestos, que roda um programa simplificado do Windows, (o mesmo de um palmtop). Nesse sentido, como todo microcomputador do planeta, a urna brasileira é "americana". Norte-americana? Talvez estadunidense, mas Ubaldo não atina com o gentílico.
A urna eletrônica não é senão um conceito, uma forma de trabalhar dados. Consiste de um microprocessador estanque (não conectado a nenhuma rede) e que trata o problema da coleta do voto com uma abordagem aritmética: o eleitor tem de saber números. O que ela faz é reunir o colégio de eleitores da seção (400 eleitores, em média) e o nome e número de todos os candidatos da eleição em questão. Alguns operadores lógicos (teclas confirma, branco e corrige) ajudam a fechar o quadro.
Ubaldo arenga que, não havendo a "materialização" do voto em papel, não há como aferir a "sinceridade" da urna; não há como recontar os votos. Ubaldo já fez "recontagem" de todos os créditos e débitos que brotam em sua conta bancária? Ou será que transação eletrônica é avançado demais pra ele?
Pobre Ubaldo.
Deixando os argumentos técnicos para os técnicos, vamos a um exercício. Lula não fei eleito no 1º turno, como esperava. Marco Aurélio e sua gangue de técnicos torturadores de bits devem ter amestrado as urnas na direção tucana, será que não? Então, por que Lula não abriu o bico, sendo presidente da República? A resposta, claro, é que Lula foi comprado pelo PSDB, como Marco Aurélio (e eu e você, leitor).
Na Bahia o candidato petista venceu no 1º turno, ao contrário do veemente vaticínio das pesquisas. Lula comprou o TRE da Bahia, está claro. Então, por que Painho não mete a boca? Painho foi comprado por Lula, é evidente...
Como, diabos, essa urna consegue o silêncio de todos os políticos derrotados, instituições, especialistas? Só pode ser lavagem cerebral, ou então todo mundo comprou todo mundo... Coisa de "americanos", não pode haver dúvidas. Em toda essa história, muito suspeita, só confio em Brunazo. Mas, esperem, Brunazo não é o cara que reivindicou a "invenção" da urna eletrônica? Que maroto, esse Brunazo. Sai por aí inventando urnas eletrônicas e depois quer nos convencer de que não são seguras...
Ubaldo diz que os "americanos" não usam nossas urnas. Pudera: eles estão ocupados demais com máquinas de cartão perfurado, tecnologia avançada, inventada por Charles Babbage, por volta da independência norte-americana, há 220 anos... Também é verdade que eles não se interessaram pelo Protocolo de Quioto, pelo Tribunal Penal Internacional, pela convenção que proíbe prisões sem o devido processo legal e outras frescuras sem a menor importância, a menos que você seja comunista. Você não é comunista, não é mesmo, leitor?
Elio Gaspari, na Folha de 2.10.06:
Na segunda-feira, com aquelas olheiras que só a adversidade eleitoral produz, 'nosso guia' se candidatou ao lugar de coordenador da campanha de Geraldo Alckmin à Presidência da República. Fez isso quando tratou do dossiê Vedoin e disse o seguinte: 'Eu quero saber quem arquitetou essa obra de engenharia para atirar no próprio pé'. Quer? Pergunte a Ricardo Berzoini e a Aloizio Mercadante. Eles podem ajudar.
Ao tratar de um crime como curiosidade, Lula assumiu a condição de padrinho dos malfeitores petistas, aloprados e trambiqueiros. Padrinho no sentido da figura de Don Corleone/Marlon Brando.
E viva a urna americana!

terça-feira, 3 de outubro de 2006

Assim caminha a democracia

Consta do Estadão de 1° de outubro:
"(...) também por competência da Justiça Eleitoral, que fez em silêncio uma espantosa revolução eletrônica que nos oferece o mais moderno e competente sistema para eleger uma péssima classe política. Já podemos dizer, de boca cheia, que uma fraude como a da Flórida em 2001, que ajudou a eleger George W. Bush, nos encheria de vergonha.
Após fatigarem a infâmia, demorando-se com entusiasmo pelos principais artigos do Código Penal, Collor e Maluf vão, de mãos dadas, dar no Congresso. A bem falar, não se sentirão peixes fora d'água. O Parlamento está repleto de maganos que tais.
Temos estrelas do porte de um Palocci, de um João Paulo Cunha, de um Genoíno. Se eu fosse funcionário do Congresso, ficaria de olho em minha carteira.
Sem esquecer do costureiro viado. O que mais lhe interessa é a decoração do apartamento funcional, segundo suas próprias declarações. Não surpreende, numa "tia" em fim de carreira.
Curioso é que o mesmo eleitorado que elegeu essa fauna mandou Fleury, Delfim Netto e Ney Suassuna pra casa. Esse mesmo colégio de eleitores negou salvo conduto para Severininho (aquele, acusado de querer a Lei da Irresponsabilidade Fiscal). Passei por Fleury no aeroporto, dia desses. De longe, se parece com um ser humano. Ninguém diria que aquela cabeça encanecida seria capaz de expelir, num frio cálculo político, uma idéia que incluía 111 "coisinhas escuras e pobres..."
Enfim, trocaram um genocida por um viado, e Yoda Cavalcanti pela bela Manuela, nem por isso menos desmiolada. Assim caminha a democracia.

Lula flopou

Emoções em grande, como se suspeitava. Lula flopou (melhor, o PT de São Paulo flopou Lula) e vai perder no segundo turno, se tivermos sorte. Com todos esses amigos dentro do PT, Lula faria bem em dispensar seus inimigos. Aécio fingirá que apóia Alquiminho, mas deve ter um acordo com Lula (não passou despercebida a maciça votação de Lula em Minas, a chácara de Neves). Serra deve estar dividido, e arrependido de ter amarelado. Teria sido eleito no primeiro turno, com o decisivo apoio do PT. Ambos só pensam em 2010, o mesmo que Alquiminho, a partir de 30 de outubro.

domingo, 24 de setembro de 2006

Denúncia: o PSDB contratou o PT

[Os] mais céticos crêem que todo governo é oportunista e composto de homens que procuram, principalmente, seus próprios interesses. A política econômica é vista como instrumento de manipulação de um eleitorado ingênuo e míope, que vota nos benefícios aparentes do presente, sem preocupar-se em entender as conseqüências de sua escolha no longo prazo. Desta forma, a sociedade oscila entre momentos de esperança, de moderada alegria nas eleições e de tristeza fora delas, o que tende a fazer circular os mesmos políticos no poder. A frase lembra a sórdida atuação de um órgão criado pelo Congresso para impedir crimes contra (ou envolvendo) o sistema financeiro – o Coaf. Subordinado ao ministro da Fazenda, o Coaf demonstra singular competência para detectar um movimento de vinte mil reais de um caseiro.
Colocada no condicional “alguns crêem que assim seja”, a frase é de Delfim Netto, que não é exatamente um jejuno em Realpolitik.
Vai ser uma semana excitante, ora se vai.

terça-feira, 19 de setembro de 2006

Volta

Chego de Brasília. Shoppings e chopes, nada de mais.
À saída do avião (na porta traseira), uma moça impecavelmente trajada e maquiada, como sói acontecer com as comissárias de bordo (não as chamaria aeromoças, para evitar as ferromoças, no caso dos trens), cumprimentava.
O horrível barulho de turbina desligando, com as palhetas se arrastando chorosas no metal, chamou a atenção de um passageiro, à frente:
"Escuta, moça", disse ele, "assim, numa hora que você não tiver fazendo nada, daria pra você desempenar as palhetas dessa turbina?"
"Perdão?"

domingo, 17 de setembro de 2006

Eugênio e Lula

Eugênio Staub, presidente da Gradiente, em entrevista à Folha de S. Paulo de hoje:
Mantenho essa visão de que o Lula pode se transformar num estadista, e só a história vai reconhecer. Ele continua reunindo as características para ser reconhecido no futuro como um estadista. (...) O Lula não é corrupto. Se em algum momento o governo escorregou nessa área foi mais no sentido de fortalecer o partido ideologicamente do que para se locupletar financeiramente, o que é um estilo de corrupção diferente da que nós vimos em governos passados.
Não sei que pensar disto. Meus três últimos equipamentos Gradiente foram conduzidos ao lixo a golpes de marreta. Um ano após a compra, via de regra, apresentaram misteriosos e consistentes defeitos. Deve ser só coincidência que Eugênio e seus equipamentos não sejam o que dizem ser... Eugênio está interessado numa fábrica de semicondutores prometida pelo Governo. Essa fábrica nunca deixará a comarca dos sonhos (dizem especialistas), mas Eugênio quer se garantir.

Anti-campanha

Não se sabe como, de repente Aecinho ganhou poderes de veto sobre Serra, estimulando o magro alquimista. Talvez por saber como funciona por dentro uma campanha presidencial à reeleição, o cardeal FHC fingiu acreditar que o magro tinha chances e aí está o resultado. Alquiminho está perto do fim da pista e freia tenazmente para não ultrapassar os 30%. Grande, Alquimico!

quarta-feira, 13 de setembro de 2006

A morte de um coroné

Ubiratan era rápido no gatilho. Massacrou 111 no fundo de suas celas: pretos, pobres e indefesos, implorando pela vida. Ubiratan era obediente, e nem um pouco burro: nunca mandaria bala num Marcola, num Escadinha. Militar, respeitava os poderes constituídos. Ainda que recebesse ordens expressas de Sua Majestadade, o Governador. Ah, não senhor, ele não faria isso...
Ubiratan concorria a deputado estadual com o número 111.
Muitos eleitores, com apetite para chacinas, votavam nele. Provavelmente inconformados com o exíguo número de pretos e pobres entregues aos cuidados do Altíssimo. Aposto que esses eleitores também não se metem com Sua Excelência, o Marcola.
Onde estará o nosso Ubiratan, agora? No céu? Junto com os pretos e pobres? Penso que, onde estiverem, logo Sua Excelência se juntará a eles.

Ubiratan, Fleury, Hitler, Stálin: esses excelentes filantropos.

domingo, 3 de setembro de 2006

Sensacional montaria de sapos

A genial fusão de sapos promovida por Glauco. Crescimento brasileiro é mais curto e mais arriscado que salto de batráquio.

sábado, 2 de setembro de 2006

Camboja

Ninguém diz adeus às armas. Os guardas desse museu, em Siem Riep, decidiram que eu e o Júlio tínhamos de ser russos, para combinar com a nacionalidade das armas em exposição.
Fala sério, leitor. Você compraria um carro desse cara, o do lencinho no pescoço?

Panda

No zôo de Pequim, por toda a tarde o panda bocejava por todos nós. Após um agosto de muitos desertos, vêm as chuvas inaugurar as necessárias primaveras.

terça-feira, 29 de agosto de 2006

Contra a liberdade de expressão

Sarney, dono da capitania do Amapá, não gosta de críticas, ainda que bem humoradas. Andou brincando de coroné em seu curral. O resultado vai abaixo:
Ao menos 80 blogs já aderiram ao "movimento" desde que a Justiça Eleitoral determinou, no último dia 25, que a jornalista Alcilene Cavalcante retirasse de seu blog a foto de um muro de Macapá no qual a expressão "Xô" é representada com uma caricatura do senador.
A foto está agora reproduzida na maioria desses blogs. O jornalista Marcelo Tas, em seu blog, disse que é preciso "varrer do mapa, aposentar de vez da vida pública brasileira, um dos maiores vermes da nossa história: o ex-maranhense e presidente Zé Sarney".Tas colocou no ar, inclusive, um santinho da principal adversária de Sarney ao Senado e escreveu: "Voto declarado".
É isso aí.

quarta-feira, 23 de agosto de 2006

Templo indiano

Templo em Déli. Não me recordo a qual ou quais deuses dedicado. Muitos deuses morreram no subcontinente indiano, e outros agonizam em silêncio no momento. Os crentes não são muito caridosos com seus protetores. Idiomas e deuses sucedem-se num vórtice acelerado chamado história.

terça-feira, 22 de agosto de 2006

Campanha eleitoral

O economista João Sayad sintetiza bem a experiência de assistir a uma campanha eleitoral, na Folha desta segunda (20 de agosto):
Brasileiros brancos, negros, evangélicos, ex-funcionários públicos, aposentados, políticos desde sempre, gordos e magros, com barba ou sem ela, caras comuns ou surpreendentes, surgem na televisão, falando as mesmas coisas. Sou o candidato do desenvolvimento, da saúde, da educação, do combate à corrupção, da mudança. Não esqueça, vote no 45, no 13, no 70. Vote no 2512, dia do Natal, fácil de lembrar.
Falam depressa, olhar fixo no "prompter", como artistas amadores, representando um personagem difícil e que não conhecem. Depois vêm os filmes -campos de soja com imensas colheitadeiras, fábricas modernas, favelados agradecidos, operários de uniforme, agricultores sorridentes, estradas bem pavimentadas, acompanhados por jingles em ritmo de samba ou de baião. (...)
No horário eleitoral, o Brasil em pessoa, sonhando com as mesmas coisas de sempre, entra na sala pela televisão como uma porta-bandeira rebolando ou um Jeca Tatu de camisa xadrez".

sábado, 19 de agosto de 2006

Stálin

Simon Sebag Montefiore, o jovem historiador britânico de quem tomo emprestadas as citações que seguem, nega o caráter enigmático de Stálin, embora reconheça sua “inescrutabilidade de esfinge e modéstia fleumática”. Passeando por suas páginas, não me escapou que há, sim, muito de enigma nesse nosso personagem. Haveremos de resolvê-lo? 1. Retratos. Loquaz, sociável e excelente cantor [gostava de entoar hinos religiosos, não sem fervor], esse homem solitário e infeliz arruinou todas as suas relações de amor e de amizade ao sacrificar a felicidade à necessidade política e à paranóia canibalesca. Marcado pela infância e de temperamento anormalmente frio, tentou ser um pai e marido amoroso, mas envenenou todos os poços emocionais. (...) Acreditava que a solução para todos os problemas humanos era a morte e foi obcecado por execuções. Esse ateu devia tudo aos padres [não por nada jesuítas] e via o mundo em termos de pecado e arrependimento. (...) Sob a calma lúgubre dessas águas insondáveis havia redemoinhos mortais de ambição, ódio e infelicidade. Dono de um humor de verdugo, disse a respeito da fracassada tentativa de suicídio de seu primogênito: “não conseguiu nem atirar direito”. Egotista exigente, nunca lhe ocorreu dar “felicidade” a quem quer que seja. Estafava as pessoas, que dele fugiam, com grande perigo para a manutenção de suas cabeças sobre os ombros. Era emocionalmente atrofiado e carecia de compaixão, mas suas antenas eram super-sensíveis. Era anormal, como todos os políticos. Stálin dialoga com sua mãe, Keké: “Por que você me batia tanto?” “Por isso você ficou tão bom”, respondeu ela, antes de perguntar: “Iossif, o que você é agora exatamente?” “Bom, lembra do czar? Pois é, sou uma espécie de czar.” “Você teria feito melhor se fosse padre”, disse ela, comentário que deleitou Stálin. Ignoro se o diálogo acima é verossímil. Impressiona o nível de ódio latente, apenas sugerido. Mas tudo isso é ninharia frente ao homem por inteiro. A grande dificuldade quando de lê sobre um monstro, ou mesmo sobre pessoas normais, é que, mesmo diante de evidências, as pessoas recuam e não concluem o que deve ser concluído. Ou só o fazem parcialmente, como se vê das citações. Uma grande perda de tempo. Do começo. Lênin tomou de assalto o estado russo, contando com a colaboração de conhecidos criminosos, muitos sonhadores e alguns idealistas. Difícil é explicar como aquela monarquia inepta, sem apetite nem vocação para governar, não ruiu antes. A “vanguarda” dos bolcheviques, composta de muitos jovens que estavam com as mãos sujas de sangue da brutalidade da luta, via-se como uma minoria isolada e combatida, que governava nervosamente um império vasto e arruinado, também cercado por um mundo hostil. Não tardou e Lênin descobriu que o desdém que devotava aos operários e camponeses era mútuo. Ele propôs órgão único para governar e supervisionar a “criação do socialismo”: o Partido. Então, improvisaram um sistema peculiar: O órgão soberano do Partido era o Comitê Central (CC), compostos por cerca de setenta membros, eleitos anualmente pelos congressos do Partido, que depois se tornariam menos freqüentes. O CC elegeria o pequeno Politburo, um supergabinete de guerra que decidia as diretrizes políticas, e um secretariado de cerca de três secretarias para governar o Partido. 2. O que foi a Revolução Russa? (...) uma mistura fervilhante e estimulante de intriga conspiratória, bizantinismo ideológico, educação acadêmica, disputas entre facções, casos amorosos entre revolucionários, infiltração da polícia e caos organizacional. Stálin – sete vezes exilado – era um revolucionário profissional. Os czares eram policiais ineptos. Inadvertidamente, ao parecer, patrocinavam férias de leitura em distantes aldeias siberianas, com apenas um gendarme de plantão em tempo parcial. Ali os exilados se conheciam, se correspondiam com seus camaradas em Petersburgo ou Viena e tinham casos com garotas locais. Quando lhes era conveniente, atravessavam a taiga até o trem mais próximo e “fugiam”. Foi assim que Koba (Stálin) evadiu-se seis vezes. Ali seus dentes começaram uma didática trajetória rumo à deterioração. É notório que ele fazia jogo duplo, delatando seus colegas para a Okhrana, polícia secreta czarista. Com isto, comprava favores (que incluía penas marotamente leves e fugas incrivelmente facilitadas), livrava-se de alguns rivais e aprendia a manipular suas vítimas - “companheiros”. Em 1922 Lênin teve uma idéia não muito iluminada. Manobrou para nomear Stálin secretário-geral do CC para dirigir o Partido. O secretariado de Stálin era a casa de máquinas do novo Estado, dando-lhe os poderes imensos que ele exerceu no “caso georgiano”, quando ele e Sergo anexaram a Geórgia. Somente Lênin podia ver que Stálin estava emergindo como seu mais provável sucessor e então ditou secretamente um testamento em que exigia sua demissão. Sua agonia final – providenciada por Stálin, a não sermos ingênuos – abriu a este o caminho para o alto. O testamento foi ignorado. Sendo o mais feroz, Stálin não teve dificuldades para afastar os demais pretendentes, principalmente Trótkski, intelectual judeu fundador do Exército Vermelho. O lance de “genialidade” veio quando, ao perceber que a trajetória de Hitler na Alemanha, a partir de 1933, era um caminho que levava, em linha reta, toda a Europa para a incineração, ele começou um expurgo em escala inimaginável. Em resumo, matou todo mundo que poderia, remotamente, constituir uma ameaça a seu poder, quase total (não nos ocuparemos da farsa brancaleônica de colegiado representada pelo CC e pelo Politburo, com membros agrilhoados por dossiês e outras patuscadas). Era fácil demais para ele aterrorizar todo mundo, já que heróis até o meio dia, à uma da tarde evoluíam a espiões, traidores e sabotadores. Fácil assim. De repente, um marechal herói de guerra era delatado por algum subalterno, preso e torturado até confessar crimes só imagináveis por mentes doentias ou pueris. A seguir Stálin sacava outra autoridade, depois outra e assim matou os mais valorosos e também muitos bandidos e alguns genocidas, como ele. Ele sempre escolhia um carreirista sedento de poder para dirigir esses massacres intermináveis. Ao cabo de alguns anos esse torturador era sacado – caía como dente de tubarão – sendo imediatamente substituído por outro açougueiro na chefia da polícia secreta e ramificações. O terror de intensificou inacreditavelmente em 1937 e anos seguintes, o que coincide com a iminência da mais devastadora guerra européia. Isto é um desafio. Como divertimento inicial, na noite de 8 de novembro de 1932 Stálin provocou ciúmes maníacos em Nádia, sua segunda esposa, revolucionária que ambicionava carreira própria. Após uma discussão acalorada na frente dos príncipes comunistas, Nádia subiu para o quarto. Tinha histórico depressivo, mas o que se passou na madrugada foi que Stálin a matou com a minipistola alemã que o irmão presenteara a ela. Os hematomas no rosto do cadáver atestam que Stálin não conseguiu induzi-la ao suicídio, tendo dado uma mãozinha ao destino. Para quê? Tirar uma mulher de gênio forte do caminho não era tarefa que um revolucionário genocida negligenciasse impunemente. Brevemente, os convidados daquela noite iriam começar a liqüidar uns aos outros. 3. Stálin freqüentemente é visto como uma vítima indefesa frente ao gênio de Hitler. Não é assim. A julgar pelos resultados, o grande jogador era Stálin. Hitler era o histérico indutor de loucuras que necessariamente terminariam em tragédias, como o Estado-Maior do exército alemão sempre soube. Mas as sobrenaturais vitórias iniciais de Hitler destruiu a salutar resistência a ele no interior do Estado alemão. Seja dito que o miraculoso rearmamento alemão, e as vitórias iniciais foram incentivadas reservadamente pelas potências vencedoras da 1ª Guerra Mundial - EUA, França e Inglaterra - obcecadas pela idéia de conter a maré vermelha, cujo epicentro era o império de Stálin. Apenas uma atitude a tal ponto maníaca explica por que Hitler tornou-se mágico, santo, estrategista miraculoso, invencível. Seus desejos mais temerários se transformaram em imperativos categóricos, mesmo para o Alto Comando alemão. Até 1942. Não tenho elementos para demonstrar que o verdadeiro estratega era Stálin, não Hitler. Algumas coisas: Stálin sabia do maciço ataque alemão, anos antes que ocorresse (o "pacto de não-agressão" Molotov-Ribbentrop - depois renegado com sarcasmo por Stálin "hein, Molotov, lembra daquele seu pacto?" - foi uma brilhante estratégia de adiamento do ataque, encetada por Stálin). Ele foi avisado por inúmeras fontes, mas tinha enxergado no ataque um meio de conseguir todo o poder. Conseguiu. Deixou Hitler carbonizar o império vermelho, para garantir o poder absoluto (ele deve ter calculado que os alemães acabariam massacrados). Deve, ainda, ter antecipado a entrada do jogador principal (EUA), as fanfarronices militares de Hitler e a impossibilidade da Alemanha resistir em duas frentes superpoderosas. Mas, e se os EUA não tivessem apoiado violentamente o esforço de guerra soviético? Sobre os escombros do império vermelho, Stálin teria sido fuzilado por seus camaradas, com grande entusiasmo. Como, no fundo, ele não era um gênio, é obrigatório que tivesse informação valiosíssima sobre os movimentos dos EUA. Teria sido, Stálin, uma “criação de si mesmo”? Pouco importa. 4. A morte de um demônio. Doze horas após o derrame, Stálin ainda roncava num sofá, úmido de sua própria urina. Apesar de seus cuidados paranóicos quanto a ser envenenado, Béria havia “batizado” seu vinho (georgiano) com warfarina, substância da moda na época, com a interessante propriedade de diluir o sangue da vítima. Mais uma vez, Montefiore: Béria “vomitava seu ódio a Stalin”, mas sempre que as pálpebras do generalíssimo tremiam ou seus olhos abriam, Béria, aterrorizado com a hipótese de que ele se recuperasse, “ajoelhava-se e beijava sua mão”. (...) Quando Stálin mergulhou de novo no sono, Béria praticamente cuspiu nele, revelando sua ambição irresponsável e falto de tato e prudência.
Béria era o último dente de tubarão da engrenagem. Já estava desgastado, em fase de desgraça oficial, e seu público destino era ser substituído por outro gentil genocida, mas dessa vez a vítima sacou primeiro (guardadas as diferenças, eu teria feito o mesmo, só que muito antes).
Enquanto os melhores médicos soviéticos estavam na prisão, os incompetentes chamados para acudir Stálin não tinham coragem de operá-lo. Béria exigia uma “garantia de vida” para o enfermo. Um respirador artificial foi trazido – após iniciar-se o padrão moribundo de respiração – e jamais usado, o que ornava com o surrealismo daquele “tratamento médico”. Após cinco dias habitando um sofá rodeado por seus camaradas, Stálin empalidece subitamente, sacode a cabeça e vomita sangue, efeito da warfarina no estômago.
Lábios azulados, já praticamente sem pulso, ele começou a se afogar nos próprios fluidos. É de sua filha o relato do mergulho final: “Seu rosto estava pálido”, escreveu Svetlana, “seus traços ficaram irreconhecíveis [...]. Ele literalmente se sufocou até morrer enquanto observávamos. A agonia da morte foi terrível [...]. No último minuto, abriu os olhos. Foi um olhar terrível, louco e irado e cheio de medo da morte.” De repente, o ritmo de sua respiração mudou. Sua mão esquerda se ergueu. Uma enfermeira achou que era “como uma saudação”. Ele “parecia estar apontando para algum lugar acima ou nos ameaçando a todos”, observou Svetlana. O mais provável é que estivesse simplesmente agarrando o ar em busca de oxigênio. Váletchka, criada pessoal de Stálin há 18 anos - mais provável instrumento de Béria no envenenamento - caiu pesadamente de joelhos sobre o corpo. Até sua morte, sustentou que “nunca houve homem melhor na Terra”.
A História é amoral, muito amiga de farsas e repetições ociosas. Ora não temos o companheiro Fidel?

quinta-feira, 17 de agosto de 2006

Lula sabia

Todo mundo que compra Playboy diz à esposa que é "por causa das entrevistas". Compro por causa das entrevistas, está claro, mas raramente me ocorre lê-las. Neste agosto mesquinho, deparei com a seguinte entrevista: Playboy: o Senhor acha que o presidente Lula sabia do mensalão? FHC: impossível não saber. Acho que ninguém acredita que ele não sabia. Ainda me lembra uma foto de FHC e Lula, na porta de uma fábrica em São Bernardo, distribuindo panfletos aos operários. Iniciavam os vacilantes anos 80, se não me engano. Ali, fazendo apologia a greves e outras infantilidades sindicais, dois futuros presidentes, prováveis 16 anos de mandato (a acreditarmos nas pesquisas), quase o mesmo tempo de ditadura... A história é mesmo estranha, e às vezes capricha. Enquanto isso Fidel (quase meio século de escabrosa ditadura) se prepara para um encontro com a mãe de todos os déspotas.

sexta-feira, 11 de agosto de 2006

A China e o resto

A China já é a segunda economia do Planeta, quando se ajusta o valor do PIB pela paridade de poder de compra, metodologia que leva em conta os valores relativos internos dos preços da economia (um corte de cabelo na China pode custar 20 centavos de dólar, mas não é essa sua real contribuição na geração de riqueza). Com 1,3 bilhão de pessoas e crescimento explosivo, a China caminha para ditar os acontecimentos do século. Os EUA levaram 100 anos em sua corrida para a supremacia econômica e militar. A China começou a sua em 1978 e a completará em pouco mais de 20 anos. Em toda parte, os mesmos ciclos: depreciação forte da moeda e manutenção artificial desse preço, com investimento agressivo em direção às exportações, inicialmente de produtos baratos, com mão-de-obra intensiva e baixa tecnologia. Depois, os produtos se sofisticam e, por fim, exportam-se produtos de tecnologia intensiva, de altíssimo valor agregado. Europa, Japão, Coréia do Sul e, agora, China. Após enriquecer dessa forma, o país pode retornar a uma taxa natural de câmbio e os preços internos sobem. A economia integra-se plenamente ao resto do mundo, já rica. A China ainda está na fase do câmbio depreciado artificialmente. Mantém o yuan – moeda instituída pela dinastia de Kublai Khan (neto de Gengis Khan) em 1279 – a uma taxa de 8/1 dólar, para desespero do FMI e dos EUA. Os EUA tentam, mas não podem mostrar os dentes a um parceiro que detém 1 trilhão de dólares em reservas, a maior parte investida em títulos do Tesouro americano. Não há ganhos com esses títulos, que até recentemente apresentavam ridículas taxas negativas de juros mas, se o cliente não for financiado, não compra. A China inunda os EUA com artigos industriais baratos, acumula saldos em dólar e os reinveste em títulos da dívida americana, usados para equilibrar a balança de pagamentos, retro-alimentando o ciclo. O dia em que a China parar de comprar os micados papéis americanos não será um dia de muita lucidez no mercado mundial. Brasil x China x Índia em números: por que não me ufano (espero que nem você, raro leitor). 1. Valores correntes (taxa corrente de câmbio). PIB China: 2.224 bilhões – 4º no ranking mundial Brasil: 792 bilhões – 11º no ranking mundial Índia: 775 bilhões – 12º no ranking mundial PIB per capita Brasil: 4.315 – 74º no ranking mundial China: 1.702 – 110º no ranking mundial Índia: 713 – 134º no ranking mundial 2. Números ajustados pela Paridade de Poder de Compra. PIB China: 9,41 trilhões Índia: 3,63 trilhões Brasil: 1,57 trilhão PIB per capita Brasil: 8.584 – 68º no ranking mundial China: 7.204 – 84º no ranking mundial Índia: 3.344 – 122º no ranking mundial
Todos os valores em dólares americanos.

quinta-feira, 10 de agosto de 2006

Tartaruga amazônica

Amiga das águas calmas do espelho d'água do hotel, a tartaruguinha tá com uma cara que denuncia preguiças.

domingo, 6 de agosto de 2006

Pesquisas qualitativas

Josias de Souza arrombou a festa, de novo. Fez um comentário tão incisivo e inteligente que terei de reproduzi-lo, quase na íntegra:

Começa daqui a dez dias a campanha eletrônica. Candidatos vão ao rádio e á TV para seduzir você. Será o teatro de praxe. (...)

Ao votar em Collor, o eleitor imaginou ter escolhido um salvador da pátria. Descobriu depois que escolhera o absurdo levado longe demais. Ao optar por FHC, pensou ter votado na tese. Elegera, na verdade, a antítese. Ao escolher Lula, presumiu ter restaurado os bons costumes. Viu-se diante de um bordel partidário. É provável que você se identifique com várias propostas dos candidatos. Desgraçadamente, isso não quer dizer nada. As modernas técnicas do marketing político põem ao alcance dos comitês de campanha ferramentas sofisticadas. Uma delas, chamada no jargão publicitário de “pesquisa qualitativa”, permite aos candidatos instalar uma sonda na cabeça do eleitor. As campanhas, antes intuitivas, evoluíram para um esquema baseado em estatísticas. Encontrou-se uma forma de captar as vontades e as angústias da sociedade. Dá-se o seguinte: atraídos por salgadinhos, refrigerantes e brindes, grupos de eleitores são reunidos em salas fechadas. Ali, avaliam vídeos de campanha, discutem propostas de governo, condenam e aprovam candidatos. Há nessas salas um vidro semelhante àquele que a polícia instala em cabines dedicadas à identificação de criminosos. A vítima vê o bandido, mas não pode ser enxergada por ele. Nos ambientes preparados para a realização de pesquisas qualitativas, o eleitor é observado, do outro lado do vidro, por magos da publicidade eleitoral. Eles passam horas ouvindo e anotando as discussões travadas nos grupos. O método permite aos candidatos afinar suas campanhas com a vontade do eleitorado. Na prática, as opiniões do eleitor são recolhidas, embrulhadas para presente e, depois, devolvidas ao dono na forma de comerciais de rádio e de TV. A mesma tática é utilizada por grandes empresas. Antes de jogar um produto novo no mercado, elas testam o gosto do consumidor por meio dessas pesquisas qualitativas. A diferença é que, adquirindo um sabonete de má qualidade, você sempre poderá substituir por outro sabonete produzido pelo concorrente. Se escolher um presidente defeituoso, terá de consumi-lo por quatro anos. Portanto, atenção. Muita atenção. (Escrito por Josias de Souza às 19h40)
Infelizmente, é verdade. Pesquisa qualitativa é o meio pelo qual o promotor de um produto qualquer (um político, por exemplo) se informa sobre o exato desejo do público-alvo. Não erra nunca.
Isto só empobrece a política, em crise.

sexta-feira, 4 de agosto de 2006

Os federais

1. Nos últimos dias a PF mostrou por que ainda é respeitada, apesar de tudo. Primeiro, prendeu vários de seus delegados, dois deles ex-superintendentes. Todos aplicados criminosos. Agora, na operação de maior envergadura de sua história, prende dois presidentes de poderes: o do Tribunal de Justiça e o da Assembléia Legislativa de Rondônia. Tudo no mesmo dia. Aplausos vigoros para os federais, e para a ministra Eliana Calmon, que teve a ousadia de romper com o corporativismo que se transformaria em cumplicidade.
Estadão on line:
"Em mais de 30 anos de atividade policial, nunca tinha visto esquema de corrupção tão extenso e tão ramificado nas instituições da máquina pública", observou o diretor-executivo da PF, delegado Zulmar Pimentel, que costuma dar o nome às operações. Pimentel acompanhou os trabalhos e a remoção para Brasília dos magistrados e membros do Ministério Público com prerrogativa de foro no Superior Tribunal de Justiça (STJ) - nove no total. As prisões e os mandados de busca foram expedidos pela ministra Eliana Calmon, do STJ.
Estadão impresso:
A prisão mais dramática foi a do presidente do TJ. Os policiais chegaram a sua casa pouco depois das 6 horas, quando o desembargador, de calção e tênis, se preparava para sua caminhada matinal. Os policiais se identificaram com educação e informaram que cumpriam mandado de busca. Pensando ter o controle da situação, Sebastião Chaves relutou por alguns minutos, mas acabou cedendo. Só depois de recolherem tudo que buscavam, os policiais lhe deram voz de prisão. A mulher e dois filhos que assistiam a tudo caíram no choro. No momento em que as buscas eram realizadas, outros juízes, promotores e amigos começaram a ligar para o desembargador, a fim de avisar que estavam sendo presos e pedir socorro. Chaves informava, desolado, que também era alvo da operação. Se operações desse tipo se tornarem rotina - e ao contrário do que sustentou o sempre lúcido Josias de Souza - o País vai mudar, sim. Pra melhor. De presidente da República até gari milionário, quem deve tem de pagar. Chega de deuses intocáveis. Chega de vacas sagradas e profundamente corruptas.
Aplausos também para o Procurador-Geral da República, que recomendou a colheita de provas contra os amamentados da Planam (gostaria que todos os "lactantes" pagassem).
As instituições respiram. Ainda bem.
2. Cuba. Cansei dos cubanos. 50 anos de tolerância com aquele bandido "revolucionário". Alguém quer, por favor, enterrar a múmia assassina? Basta.

segunda-feira, 31 de julho de 2006

O processo político

Elio Gaspari, que já incursionou pela história recente do Brasil, escreveu, na Folha de São Paulo deste domingo: O Congresso Nacional já foi fechado sete vezes (1823, 1889, 1930, 1937, 1966, 1968 e 1977). Às vezes, foi-se embora numa ventania que mudou o regime (1889, 1930 e 1937), mas houve casos em que o pretexto foi uma votação na qual o governo saiu derrotado (1968 e 1977). O Congresso não produz crises institucionais, mas é sempre seu estuário. Chega uma hora em que o seu recesso parece solução de um problema, quando é apenas um truque do Executivo para impor sua vontade. Em 1968 o problema não esteve na negativa da licença para se processar o deputado Márcio Moreira Alves. A crise estava na anarquia militar. Em 1977, o congelamento de uma reforma do Judiciário foi, documentadamente, puro pretexto. O que o governo queria era garantir eleições indiretas nos Estados e fabricar uma maioria no Senado. Gaspari parece temer que um autocrata, recém-eleito, use algum pretexto para instituir nova farsa republicana. Não acredito nisso. O problema é que o processo político já não medeia soluções, exigidas pela sociedade. Ver a China crescer onze por cento ao ano, por décadas a fio, sem qualquer justificativa razoável, produz muita ansiedade e perguntas. Que diabos o Brasil está fazendo? Por que até a Índia, a Geni entre os países pobres, cresce mais que nós? A China não tem um Judiciário digno desse nome, não garante os investimentos de ninguém e está pouco se lixando para direitos autorais ou lealdade no comércio com outros povos. Seu sistema bancário acumula créditos podres impagáveis. A montanha de dólares oriunda das exportações (1 trilhão de dólares) são investidos em papéis do tesouro americano, e assim retroalimenta o delírio consumista norte-americano. No entanto...
A conclusão é que o processo político brasileiro está falido e não há perspectivas. Pelo menos, não temos aventureiros à vista. E o Congresso pode gazetear à vontade...

segunda-feira, 24 de julho de 2006

Questão preconceitual

Ricardo Noblat, citando Lula:
(A oposição) não tem medo de Lula. É questão preconceitual. Porque neste país não existe a cultura de aceitar as pessoas de outras camadas ocupando espaços importante.
O comício, em Brasília, foi prestigiado por uns 1500 simpatizantes.
Fernando Rodrigues, que o presenciou:
E a animação? Fala sério. Fiquei no fundo da platéia. Nada. A galera presente ficava olhando, não cantava, não se mexia. É claro que os 200 na frente do palanque pulavam como nunca –mas é sempre assim, até em programas de TV, certo?
Lula teria dito, nesse mesmo discurso, que teve de cortar no sangue.
Talvez seja mesmo uma questão "preconceitual".

sexta-feira, 21 de julho de 2006

O capataz

Logo após cruzar uma ponte nas cercanias de Varanasi (Benares), construída pelos ingleses (parece que a última vez que alguém se importou com infra-estrutura na Índia foi na época dos ingleses, finda em 1947), vê-se um enorme pátio em que trens carregados de carvão chegam e são descarregados por escravos hindus, como na foto.

Na ponte, milhares a pé, de ônibus, riquixá, bicicleta, caminhão. Em comum, a miséria. Lá embaixo, lânguidos búfalos recreiam às margens do Ganges.

O capataz achou mesmo que eu não teria coragem de fotograr seus escravos, mas eu mostrei que ele estava errado.

quinta-feira, 20 de julho de 2006

A beleza

"Então, o que aconteceu com esse cara?", perguntei ao Hudson.
"Você notou como ele é bonito?"
"Sim, vi como é bonito", disse. Na verdade, ele parecia um esquilo semi-afogado, mas não quis contrariar.
"Aquele homem tinha duas esposas, e é tão terrivelmente bonito que as duas passavam o dia brigando para ver quem dormiria com ele à noite. Ele acabou favorecendo uma delas, a outra ficou invocada, foi até o feiticeiro e jogou uma praga nele. E agora ele não consegue lembrar nem o próprio nome."
"Se você tem duas mulheres, é perigoso ser tão bonito", um dos velhos concluiu, gargalhando.

*(Memórias de um Primata, Robert Sapolsky) Não, o cavalheiro da foto não sou eu...

quarta-feira, 19 de julho de 2006

Monte Fuji

Estão vendo o chapeuzinho vermelho aí em cima? Podem parar de rir, por favor: sou eu. Ao fundo, o monte Fuji, injustificadamente reverenciado (é um vulcão como outro qualquer, mas sem as imposturas de lavas e erupções).

terça-feira, 18 de julho de 2006

Me

Na primeira foto, conceda um Indiana Jones, bom leitor, ainda que após algumas crises de malária. Ao fundo, o rio Negro, passando por Manaus.

Na segunda, um rambo de escassa bravura e mirrada musculatura faz o que pode para aparecer. Em tempos meu índice de gordura corporal era 23 por cento. O resto era só músculos e revigorados ossos. Agora as proporções se inverteram... Estou num museu militar em Siem Riep, norte do Camboja.

Ofereço estas fotos para os dois leitores que me visitam, religiosamente, a cada ano.

segunda-feira, 17 de julho de 2006

Cidade Proibida

O dia em seus tardores. Após fatigar a Cidade Proibida, em passos vagamundos, visito seus arredores, no centro da velha Beijing (Pequim). Um imodesto arrebol mostra o laguinho, glaciado. Não deveria me sentir tão só. Não enquanto o sol afiança o dia, desistido.

sábado, 15 de julho de 2006

Filosofia de jacaré

Em que pensam os jacarés, quando se enterram na lama, à espera da próxima cheia?

Este refletido jacaré é versado nos negócios da lagoa.

Pescaria

Primeiro, ariranhas invadiram nosso lago, em que pescávamos com entusiasmo (os peixes acharam um tanto exagerado esse entusiasmo, e resolveram não morder as muitas iscas, que boiavam desoladas). O fervor continuou, numa nova lagoinha, num mundo de lagoinhas fáceis. Nenhum peixe, exceto piranhas, excessivamente modestas. Abstive-me dessa pescaria, e fui atrás dos pássaros, renomados pescadores. Enquanto isso, febris formigas imprimiam nova geometria a meus pés. O saldo da pescaria foram os óculos de Sabrina - a californiana à direita - esquecidos na van, dos quais fui eleito guardião.

sábado, 8 de julho de 2006

Pantanal



Felizmente os antílopes não cobram por foto. Arisco, este foge para a segurança de banhados infindáveis. As fazendas, imaginárias, e suas cercas desmoralizadas pouco podem fazer para deter esse serelepe visitador.

domingo, 2 de julho de 2006

Memórias de um Primata

Termino agora as Memórias de um Primata, livro divertido, interessante, mas também trágico. A certa altura o autor (Robert M. Sapolsky) anota, sobre seus babuínos:

"Eu sou o bicho-papão escondido no armário das crianças, sou o terror dos babuínos, silencioso, furtivo e perverso: sou o cobrador de Belzebu. Mais um babuíno atingido com sucesso pelos meus dardos. Euforia. Hoje acertei Gengiva, o babuíno que jamais imaginei conseguir pegar. Malandro, astuto, sabia todos os meus truques, me enganou por meses. Eu estava quase entrando em desespero, precisava conseguir uma amostra de sangue dele. E hoje ele vacilou. Achou que estava seguro, rodeado por um bando de fêmeas, acreditou que elas iriam protegê-lo no caso de um ataque, achou que eu não ousaria atirar no meio de uma multidão, mas ele estava errado!

Minha experiência com babuínos é mais modesta. Resume-se a um encontro no Cabo da Boa Esperança, ao sul da Cidade do Cabo, África do Sul. Eram animais acostumados a turistas, desencaminhados, portanto. Seus gigantescos caninos e postura agressiva intimidavam.

Robert conviveu com essas criaturas, descreveu comportamentos comuns a outros primatas e anotou coisas realmente perspicazes sobre ambição, inveja e sadismo. Em cada bando o macho alfa (líder) tem o direito de escolher dentre as fêmeas no estro. Os demais ficam com as enjeitadas.

Por sucessivos golpes de sorte e muita instabilidade no bando, o jovem Benjamim herdou esse posto, num curto período (o autor dava nomes bíblicos aos animais do bando em estudo). Benjamim

não inspirava muita confiança nos demais. Certa tarde, o bando o seguia numa passagem estreita entre dois bosques cerrados. Benjamim liderava o grupo. Bom, babuínos machos, de qualquer posição no ranking social, raramente lideram o bando em exploração pelo terreno. Na verdade, podem até tentar, mas raramente são seguidos. Eles não sabem para onde estão indo, pois estão no bando há pouco tempo. Normalmente as velhas fêmeas é que são seguidas pelos outros. Pois Benjamim vinha andando na passagem entre os dois bosques, sem nem mesmo olhar para trás. Enquanto isso, as duas matriarcas do bando, Lia e Noemi, decidiram mudar de direção e entrar na mata, e todos os outros babuínos as seguiram. Benjamim prosseguiu, orgulhoso, passou na frente do meu jipe e finalmente olhou para trás. Deus do céu, onde foi parar todo mundo? Ele correu pelos arredores, hipeventilando, e num momento de tola inspiração cognitiva aproximou-se de mim, abaixou-se, e procurou sessenta e tantos babuínos embaixo do meu veículo.

O livro prossegue descrevendo o mosaico de atrocidades e tragédias humanas que compõe a África, hoje como há séculos. Quem quer que visite os cassinos do Reino da Suazilândia, ou as favelas de Joanesburgo, pressente algo de incurável naquele continente.

sábado, 1 de julho de 2006

Boca da Onça

Após alcançar uma garganta na Serra da Bodoquena, o riachinho se projeta num abismo de 164 metros, alegria chamada Boca da Onça.

A derrota

Josias de Souza sintetizou este espantoso sábado: Denúncia: o Brasil derrotado pela França é falso. Se aquele selecionado, pródigo em promessas, não é falso, então será caso de recall. Particularmente, sustento que a bolinha que a França joga daria pra ganhar do Paraguai; talvez da Espanha, com sorte. Do gigante da ginga e inventividade, nunca. Que mudem o técnico, os jogadores, a catatonia em campo toda vez que enfrentamos a risível França.

Boizinhos passando

Obedientes, os boizinhos passam, sincronizados. Não esperem deles muita organização, nem bravura. À simples menção de um barulhinho, um chiado, explodem em fuga pânica. Também habitam o pantanal, em espaçosas e muito confortáveis fazendas.

quinta-feira, 29 de junho de 2006

My scotland's friends

Amigos escoceses, no pantanal. O nome dela é Morna (imagino que signifique algo em celta). Terão de perdoar eu não me lembrar do nome dele.

quarta-feira, 28 de junho de 2006

domingo, 18 de junho de 2006

Pantanice

Num pau-de-arara pela Estrada Parque. Pequenos jacarés saúdam o visitante por todo o caminho. Saberiam a canto, não fosse a infinda sinfonia de aves tão nobres e apresentadas. Com minhas retinas e minha fotográfica, registro a performance de infatigáveis atores emplumados.

domingo, 4 de junho de 2006

O Supremo

Do advogado Sydney Sanches, no Valor deste final de semana: “O Supremo deveria ser composto por onze estadista. Quem deveria indicar? Um estadista. Não se pode colocar o Direito acima do Estado. E isso é uma posição política.” Ele finaliza: “quando a questão (...) envolve o erário público, o Tesouro, o valor da moeda, a soberania, a cidadania, a nacionalidade, o Supremo tem que ter uma visão de estadista.” Sanches conduziu a maior catarse da história republicana, quando presidiu o Senado arvorado em corte de julgamento de Psycho Collor. Na cadeira de juiz do Supremo, Sanches não viu provas para a condenação do ex-presidente. “Não se pode ter motivações políticas para a condenação de alguém”, ele argumenta. O advogado Junqueira diz que o Supremo não tem perfil para julgar crimes (consideraram inepta a denúncia ofertada pelo então Procurador Geral Junqueira). Que inépcia houve, não há dúvida. Discordo sobre quem nela incorreu. Após haver fatigado a infâmia, passeando com entusiasmo pelos principais artigos da Lei Repressiva, Collor de m. se perdeu na noite penal. Não coloco em dúvida a necessidade de posicionamentos políticos por parte do Supremo, e mesmo de juízes de menor graduação, tal como defendia R. Dworkin. Em verdade, penso que se poderia falar em atuação estratégica do Estado-juiz, em vista da não-neutralidade inerente a qualquer julgamento. O que não quer dizer liberdade para um concurso de conveniências estabelecendo poltronices. Não se pode colocar o Direito acima do Estado. Se o Estado cria o Direito soberamente, não vamos aplicar esse Direito, livremente auto-imposto?

sábado, 3 de junho de 2006

O Pantanal e as Vaquinhas

No vasto continente das aves – o pantanal – sábias vaquinhas, em fila indiana, cultivam a amizade das palmeiras. Do intrometido aviãozinho, só a sombra, no canto. Apesar da devassa, os delicados floquinhos de vaca mantiveram a festa, à espera das águas.

sexta-feira, 26 de maio de 2006

quinta-feira, 25 de maio de 2006

A velha Praha

A igreja do castelo onde Kafka viveu, em toda a sua imponência. O cômodo destinado a Kafka mais bem seria uma casa de bonecas.

Abismo Anhumas

Num semicírculo, profetas fosforescentes se revelam na luz que colhe o Anhumas em tons azuis. Vigio do alto essa ocorrência interessado em silencioso discurso dependurado a 70 metros do espelho de um secreto lago. Constam mastodontes, preguiças gigantes em suas profundezas escuras, e dois mergulhadores intrometidos perturbando o respeitável sono de coisas há milênios recolhidas a mistérios. Fósseis de formas ancestrais de vida, extintas sob a supervisão das eras, imersos numa membrana líquida ao abrigo do manejo humano. O trabalho profuso do calcário escultor ganha uma nave ao interior da terra, lavrando a rara catedral nos recessos do cerrado. O discurso anil de profetas telúricos arrojado em grego ao abismo faz prova dessa luz fria em profunda menção: a terra são silêncios. Vigio do alto essa coerência. Março de 2002.

quarta-feira, 24 de maio de 2006

A mesa e o rio

Se as águas são um chá encorpado, a mesa está bem posta no singelo tributário do Amazonas. Foto de 2006.

segunda-feira, 22 de maio de 2006

Pantanices

Na estrada que leva a Corumbá encontrei esses cantores. Nunca vi aves mais exibidas, num mundo de aves sobremodo exibidas. Cantores soberbos.

segunda-feira, 15 de maio de 2006

O barquinho

Infinda solidão afronta o barquinho na despedida final da tarde. Saberá o céu de sua provisória existência? O barquinho perfura as vigências mais desesperadas e almeja dulçor. Arrebol de Corumbá (MS), 2006.

domingo, 14 de maio de 2006

Evices

Pra não dizer que não falei das flores, neste dia das mães. Foto tirada em algum lugar da Tailândia (eu acho...) Marrentinho terminou sua greve de fome, para decepção de muitos. Não conseguiu sua candidatura, não perdeu o excesso de peso, mas ganhou lindas coroas de flores, presente dos funcionários públicos. Alguns (os indelicados) disseram: “nunca pensei que ficaria feliz em ver um garotinho passando fome”. Sobre as evices mais recentes, Simão, cientista político, sintetizou tudo, em grande magistério: a Bolívia continua mandando coca. Agora é coca sem gás.

O silêncio dos inocentes

Decorrido mais de um ano do escândalo do mensalão, Delúbio Soares mantém-se em obsequioso silêncio. Trancado em seus rancores, carrega sozinho todas as culpas –as particulares e as alheias. É eloqüente a mudez de Delúbio. Convém dar ouvidos ao seu silêncio. Apurando-se os tímpanos, pode-se escutar a denúncia embutida na ausência de manifestação do ex-gerente de arcas. Há virtude no silêncio de Delúbio. As palavras que ele não diz gritam que o país foi governado sem método. Alardeiam o uso de meios que não justificam os fins. Bradam o emprego de táticas vis. Silvinho Pereira, um sub-Delúbio, ousou triscar os lábios no trombone. Um emissário do politburo chamou-o à razão. E ele se fez de doido. Melhor assim. Os 53 milhões de eleitores vitoriosos em 2002 não suportariam a condição de cúmplices involuntários. Há utilidade no silêncio de Delúbio. Sua quietude ajuda a amplificar pequenos rumores. Ruídos como o que foi produzido no último encontro nacional do PT. De tudo o que já foi dito acerca das perversões do petismo, nada soou mais desconcertante do que a decisão de adiar sine die o julgamento dos que conspurcaram a legenda. O desaparecimento da voz de Delúbio pôde berrar ainda mais alto. Proclama que a história não-contabilizada do PT conduz o governo petista da prometida Canaã ética para algum obscuro inferno de depravações. Há compaixão no silêncio de Delúbio. É graças a ele que o país pode conviver com a figura inacreditável do presidente cego. Mais do que nunca, entende-se a profunda grandeza das respostas que Delúbio vem calando há mais de 12 meses. A mensagem invisível de Delúbio, expressada no silêncio de dezenas de entrevistas negadas, é cristalina. Informa que remoer o escândalo significaria trazer à tona um Luiz Inácio indigno do velho e bom Lula da Silva. Há sabedoria no silêncio de Delúbio. Sem ele, a nação teria de conviver com a imoralidade do presidente conivente. Teria de enfrentar o escárnio do governo inaceitável. Teria de encarar a vergonha do Estado ocupado por saqueadores. Há higiene no silêncio de Delúbio. Com sua mania deletéria de espiar pelas frestas de fatos idos, jornalistas, procuradores e outros desocupados apenas tentam remoer lixo. Não há do outro lado senão cenas de uma película sem mocinhos. Um filme cuja reprise inspiraria ânsia de vômito.Um brinde, portanto, à insanidade de Silvinho! Uma salva de palmas às meias-verdades de Marcos Valério! Loas ao silêncio de Delúbio, a cada dia mais ensurdecedor! Josias de Souza perpretou essa maldade às 22h46 de ontem. Não devia. Estou cada vez mais alarmado com jornalistas metidos a falar "cousas". O estilo é raro, sóbrio e límpido. Seria lícito um estilo quase poético para falar de política? Não importa... * a foto acima foi tirada numa aldeia indígena próxima a Manaus.