domingo, 22 de novembro de 2015

Reynaldo Rocha: O país viciado em morfina

Somente quem já teve a necessidade de ser medicado com morfina pode entender o uso dessa droga. Nada contra: sentir dores é pior, muito pior. O problema maior é que ela oculta a doença. Faz com que as dores sejam suportáveis e desapareçam. Mas elas retornam ao fim da dose ainda mais intensas.


Durante a paz da droga, não se consegue enxergar um metro à frente. A ausência da dor é tão bem-vinda que leva o usuário a esquecer do entorno.

Existe morfina para um país? O Brasil mostra que sim. Um país não morre. Não desaparece. Sempre renascerá no dia seguinte. O que leva uma nação a usar morfina? Quem receitou esta droga que alivia dores e elimina a capacidade de raciocinar, interpretar e tomar para si as decisões?

Acompanhamos mares de lama que nos afogam. Somos instados a escolher entre o bandido da Suíça e o canalha de São Bernardo.

Como no conforto do opióide, deliramos acordados. E ignoramos que há um mundo fora da agulha no braço.

Quem está inebriado se esquece que a dor maior vem depois. O fim do efeito da anestesia é o começo do pesadelo.

O Brasil está anestesiado, viciado em morfina. As doses são sempre mais elevadas.

Um mal é substituído por outro. A terapia não busca a cura. Só prolonga a sobrevida.


Até quando? Um país não morre. Mas o país somos nós. E nós somos finitos. Com ou sem morfina.