sábado, 7 de janeiro de 2012

Antígua

Antígua tem o horizonte dominado por vulcões. Subimos ao Pacaya, que explodiu em 2010, sem aviso. Levou um jornalista.

Do alto - 3.600 metros - avista-se a própria capital, a 60 quilômetros, Antígua e o majestoso Acatenango, 4.000 metros de calma soberba.

Por enquanto.

Na descida considerei vender o bastão de madeira que apoiou meus esforços na face dura do vulcão. Pedi dez dólares, não mais, considerando a história daquela peça, seu valioso suporte a corpos esmaecidos.


O pequeno índio, versado nos negócios com turistas, regateou bem: 

- Tres quetzales, no más.
- Vendido por cinco dólares a este garoto! - apregoei, triunfante.

A cifra tocou alguma nota no menino, talvez porque fora o preço a mim proposto, pelo próprio, no início da negra subida.


- Sabes que más, no tengo la plata - disse-me ele, mas eu o apresentei ao edificante mundo da intermediação financeira.


"Además" lembrei, num misto de espanhol, português e outras línguas que estão por ser inventadas, "este não é qualquer bastão. Com ele defendi todo o grupo contra a perfídia de feras indômitas, que espreitavam no caminho, tornando insegura a travessia. ¿Ora ignoras que sou pantaneiro, acostumado ao embate diário com feras matreiras? Que desde tenra idade me nutro de leões e sucuris?" (a parte dos leões não é inteiramente exata, mas julguei que convinha à evolução da conversa).


Seja como for, consegui algum saldo entre a compra (um quetzal) e a venda, cujo valor não revelo, dado o sigilo desse tipo de engenharia financeira. 

A paisagem da América Central testemunha uma robusta população desses titãs tranquilos, com repentes de orgulho e ira. Manágua, por exemplo, não é mais que uma concessão de vulcões com baixos teores de rancor.

Por enquanto.

Ciudad Panamá

Volto ao Panamá, após um vôo realmente suave, num Embraer novinho, da Copa.

O taxista não sabia onde ficava a pousada, ao contrário do que declarara nas calçadas do aeroporto, então, me deixou no meio da rua. O taxista seguinte, após 30 minutos de procuras, declarou que também não fazia ideia. 

Por fim, ao cabo de dez ligações, fomos informados da possível localização do hostal, entre as calles España e Porras. Eu que o diga. 

Não ficava longe. Se escondia num emaranhado de informações equivocadas. Parece que oscilava de um bairro a outro, esquivando-se das manobras desesperadas dos taxistas. Cheguei exausto, e dois dólares mais pobre.

Seria compreensível na Guatemala, ou Honduras, onde os endereços são quase tão claros quanto isto: perto do antigo bar do João, dez quadras depois da caixa d´água, antes da borracharia do finado Mário. Sei lá.

Saí para compras, que resultaram frustradas. Os malls são grandes e desinteressantes, sem eletrônicos de ponta. ¿De que me serve o Panamá sem eletrônicos transados? Descobri o que queria no site americanas.com.br, por um preço quase razoável, considerada a passagem ida e volta a NY.

Amanhã saio para ver a cidade, e o Canal. Do alto vi alguns navios se esfregando, numa das esquinas dessa via. Depois, embarco de volta.

Não é outra coisa não.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Panajachel

Se o leitor não se sente confortável quanto à pronúncia, não será punido se disser apenas Pana.

Trata-se de um vilarejo às margens do lago Atitlán, incensado por Huxley. Povo engalanado em vestes tradicionais indígenas, numa rica tapeçaria humana, o que lembra muito a gente das montanhas ao norte do Vietnã, na fronteira com a China. Esses trajes, ricos, não são vendidos, mas transferidos entre as famílias. E o idioma é musical e misterioso. 

Atravessando o lago, nos vilarejos menores, você depara com cooperativas de artesãos, pintores, escultores nativos, e vive os dilemas do consumo.

Em San Juan um índio me aliviou de meus últimos dólares, e me confiou um seu trabalho. Não dá pra resistir ao charme e labor autêntico desses descendentes dos maias.

Vindo para Guate (Cidade da Guatemala) reparei nos ônibus, de um colorido psicodélico, tripulados por ferraristas de alma. São máquinas modernas, encarroçadas localmente (pensei), que voam pelas sinuosidades emolduradas por vulcões. Às vezes o passageiro é admitido de inopino, no passeio. O cobrador abre a portinhola traseira, pega o balaio, sobe uma escada pelo lado de fora, acomoda a bagagem no teto, desce a escada, pula para a oposta, abre a escotilha e se aconchega junto aos passageiros. Tudo com o ônibus em furiosa passagem montanha acima e abaixo. 

Não concordo com os riscos assumidos, mas é bonito ver o trabalho desses acrobatas.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Atitlán

O lago é emoldurado por cones, restos de um antigo vulcão, massivo. Há uma neblina permanente, e uma luz azulada sob o sol. Nas bordas, vilarejos e vilas de agricultores, artesãos - a gente do lugar - com língua e costumes próprios. 

Se o leitor pensa em miséria e guerra civil ao ler Guatemala, bem, isso é passado. O povo é pobre, mesmo para padrões brasileiros, mas sem miséria. E, agora, tudo se volta ao turismo, o que faz todo o sentido, considerando as formidandas paisagens e motivos deste admirável país. 

Amanhã, Panamá. Convém curtir mais um pouco.

Antigua

Passei um dia nessa cidade, a mais bonita da viagem (e olha que a disputa inclui Granada, Copán Ruínas e Flores). 

Agora, estou numa cidadezinha na beira do lago Atitlán, que Aldous Huxley comparou ao Como, na Itália. 

É um espanto a Guatemala, e esse lago, parte da cratera de um vulcão verdadeiramente colossal.

Amanhã volto a Antigua e, logo, a Guate, onde embarco para o Panamá, finalizando a odisseia maia.

Um espanto.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Tikal

Volto de Tikal, fascinado.

Em selva luxuriante, uma miríade de templos e palácios se erguem, testemunhais.

Do mais alto se avista a floresta eterna. Percebo sua contribuição para a majestade do conjunto. O aparato parece obra de imortais, e como tal o tratei.

Quando sobre a Praça Central o sol nasceu indaguei se ali ainda moram divindades, e quais suas reivindicações.

Agora, uma caminhada cuidadosa nessa beleza chamada Flores, insuspeitada mesmo nos mapas mais atentos.  

Logo mais saio para Antígua.

Flores

Perto de Tikal, Guatemala, hà uma cidadezinha historica em meio a um lago: Flores.

Cheguei há pouco, e logo mais estarei em Tikal, para ver o sol  nascer nas ruínas milenares.

domingo, 1 de janeiro de 2012

Hélio e a felicidade

Aí está, Hélio mandando bem mais uma vez:

O ano começou. É tempo de resoluções. As promessas que fazemos a nós mesmos com o intuito de nos tornar pessoas melhores e mais felizes podem assumir muitas formas: iniciar aquela dieta, exercitar-se regularmente, não pegar tanto no pé do filho adolescente. Invariavelmente elas dão com os burros na água. Por quê?

O florescente ramo dos estudos da felicidade traz algumas pistas interessantes. Nós, seres humanos, somos ruins em agir com vistas a metas futuras porque, ao contrário do que acreditamos, nossa experiência de "eu" se decompõe em muitos eus que funcionam de forma diversa e têm interesses, às vezes, conflitantes.

É preciso distinguir entre o eu autobiográfico e o eu que vive as experiências. O primeiro é um ator racional, que gerencia as informações e, em geral, toma as decisões. O segundo é pura sensação. É ele que, minuto a minuto, experimenta as dores e os prazeres a que nos submetemos.

E o problema é que o eu autobiográfico age como um tirano, que nunca leva em conta os interesses do eu experiencial. Operando mais com a memória do que com o instante, não hesita, por exemplo, em aumentar a experiência dolorosa aqui e agora, desde que isso lhe pareça necessário para maximizar o que imagina serão suas lembranças futuras.

O eu experiencial, embora menos poderoso na hierarquia cortical, não está desprovido de meios. Ligado às camadas mais primitivas do cérebro, mobiliza recursos como a preguiça e o desgosto, capazes de sabotar até as mais sólidas resoluções de ano novo. 

Esse descompasso entre os diferentes eus está na origem de alguns dos mais importantes erros (ou acertos) que uma pessoa pode cometer, consubstanciados em decisões como as de poupar para a aposentadoria, casar-se e ter filhos. O problema aqui é que o eu futuro imaginado quase nunca corresponde ao eu futuro real. É por isso que a busca pela felicidade é mais capciosa do que parece.

Copán

Copán é uma cidadezinha histórica fantástica, a um quilômetro das ruínas. 

Visitei esse esplendor maia, no seio da floresta. Pirâmides enormes, cravejadas de inscrições, contam a história das dinastias, no que talvez seja o maior, ou pelo menos mais robusto livro já escrito...

O museu adjacente traz inúmeras peças megalíticas, resguardadas da intempérie, e diz muito sobre esses reis e seu povo industrioso. Sítios fervorosos. Ao fim da tarde de descobertas, jantar no Carnitas, para marcar a vitória, e compras de soberbas réplicas maias, feitas por seus descendentes. 

Estou para Tikal, colosso no outro lado da fronteira, para onde me dirijo de na macia madrugada.