O Camboja, antigo Reino do Khmer, abunda em templos na selva, bucólicos e desistidos. Inacreditáveis construções remetem a mil anos, e registram com fidelidade todos os sectarismos que a floresta, as monções e as guerras impõem.
Turistas lotam seus recintos, de uma maneira que eu não supunha possível, e a impressão geral é de um imenso parque de diversões votado ao budismo. Em toda parte, intermináveis hordas de turistas que não cansam de ser japoneses, em contínua expansão.
Templos saqueados, há muito desertos de seus criadores, marcham plenos de caos rumo à eternidade. Cansados de sua antiga anarquia, concertam secretamente a posse de um novo povo, no regresso a uma remota e velhíssima economia da alma.
Não há uma só pedra, por modesta, que não tenha fatigado um artista, naquele instante delegado ocasional da eternidade. Ao pôr-do-sol esses monolitos acendem, vibram e consentem a passagem para outros atavismos.
O sol é inclemente, mas felizmente não chove nessa época do ano. Com um pouco de boa vontade é possível se sentir feliz nessa pétrea cidadela religiosa.
Phnom Penh, 11 de janeiro de 2006.
quarta-feira, 11 de janeiro de 2006
segunda-feira, 9 de janeiro de 2006
Angkor Wat
Assombrosos solecismos de pedra.
Um superparque, com centenas de templos, a maioria com mil anos de idade, dispostos em jardins que descrevem retângulos, às vezes quadrados, circundados por água.
Todos exibem as marcas do tempo, das guerras, dos movimentos políticos e das pilhagens, comerciais ou ideológicas. A maioria das estátuas jaz decapitada, e os templos são, muita vez, amontoados de pedras lavradas. Enormes blocos de pedra emulam pirâmides e, de fato, são pirâmides, com escadas íngremes, cada degrau com altura e largura diferentes.
Errei por esses labirintos, a princípio fascinado, depois indiferente e, por fim, desesperado ante o interminável, a atroz sequência de áridos recintos, visitados por monges budistas lamaístas.
Na maioria deles, infindáveis salas dispostas em sequências transversais. No cruzamento dessas sequências, a ilusão de estar diante de um espelho, tão perfeita a simetria. Em muitos desses templos, árvores gigantes. Figueiras assaltam a pedra, subordinando-a a suas ambições. A floresta cobra o terreno que um dia lhe pertenceu por inteiro.
Angkor Wat é o nome genérico desses monumentos, testemunhas da avançada civilização que um dia frutificou no sudeste asiático e que em sua glória edificou esses espantos.
O Camboja tem uma grandiosa herança do Khmer, e a desastrosa herança do Khmer Vermelho, pesadelo que só recentemente abondonou o País.
Siem Riep, 9 de janeiro de 2006.
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