Carlos e a filha subiram ao Corcovado, domingo de frio no Rio. Vinham do Jardim Botânico, insuficiente para o preenchimento de um domingo de Clara.
Ela flutuava alegremente numa torrente de momices e garatujas. Enquanto o trem descia a encosta, quis saber se ali havia cavalos.
"Florminha" disse o pai, amoroso "cavalos não gostam de montanhas e florestas, comprometidos com a grama, o campo aberto." Mas Clara não se deixou impressionar com essa demonstração de má-vontade. Queria cavalos ali, e ordenou que, dali em diante, todo bom cavalo que assim desejasse poderia habitar aquela floresta, acolhedora. E conferiu-lhes poderes para beberem das muitas bicas e se agasalharem nas nuvens que visitam aquela montanha, especialmente aos domingos.
Muitos cavalos atenderam ao chamado, e foram, felizes, guarnecer as encostas, para o gáudio de menininhas que descem a montanha. Lá embaixo, no Cosme Velho, todas querem uma visita à casa de Cecília Meireles, e ao palacete do general onde o Bruxo se casou.
Nota-se quanto esses cavalos estão mudados. Alguns vivem em galhos, e são amigos das flores e frutos; outros desenvolveram o vôo, e às vezes cantam, ao sabor das necessidades poéticas das clarisses e joanas. As marianas reformaram a altura e peso desses animais, risonhos; alguns não passam de alguns centímetros, enquanto outros mais e mais se aproximam das medidas de hipopótamos, seus parentes, conforme faz prova o nome.
São muitos os encantos, se uma menininha se propõe suavizar o mundo. E toda a natureza lucra com esses aditamentos. Os animais, absolvidos de sua antiga servidão, se dedicam a visitar flores e entoar a primavera. Cavalos são ali facilmente passarinhos.
Mas alguns ainda olham, com volúpia, para os verdejantes campos sediados na distância.
Clara, uma delícia de criança, agora queria uma visitinha ao Pão de Açúcar.
Rio, 13 de junho de 2004.
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