Num acesso - pouco edificante - de insensibilidade ecológica, comprei presas de elefantes no Camboja. Eram duas enormes peças, pesando uns 18 quilos, de um marfim ricamente matizado em tons de amarelo.
Sem me importar com a ameaça de extinção do elefante asiático, e tampouco com a suspeita de ilegalidade da aquisição, comprei-as a módica quantia, e estava feliz com a façanha. Parecia que eu triunfara sobre a fera na indevassável selva cambojana.
Depois desse dia, um sonho, recorrente:
um rio de gárrulos elefantes dava voltas e mais voltas em torno a uma pedra que podia ser os restos de uma estrela, mas também era meu túmulo, e ardia. Eram elefantes negros, ferais e banguelas.
A horrenda ciranda seqüestrava os sonhos, multiplicando recriminações e remorso.
Hoje, no aeroporto de Chiang Mai, oportunos guardas vieram me absolver de meu crime, confiscando as presas, espero que para sempre. O comprovado fato de serem presas falsas não me socorreu, porquanto as feras seguiam crescentemente destroçando minhas noites. Com júbilo, com alívio passei adiante esse pesadelo, e espero que ninguém mais dele se aposse. Com o tempo, possa eu esquecer o delito, e os sonhos retomem seu curso mais pacífico.
Chiang Mai, 16 de janeiro de 2006.
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