quarta-feira, 13 de março de 2013

Laranjeira


Esta é a história mais simples que consegui imaginar. Não é a melhor, nem a mais sofisticada. Coisas complexas me ocorreram, mas eram fraudes. Então conto essa historinha, tão singela, não fora alguns truques que acrescentei na madrugada febril.

Ilíquida anda-me essa história, indecisa em seu enredo. Não quero acrescentar detalhes outros que não os estritamente necessários ao seu funcionamento. É uma história, como direi, despretensiosa, feliz em si, comunicante: resolvida.

Muito diversa das histórias que ando lendo, de multiversos e outras intoleráveis repetições e pequenas variações do nosso mundo, tão afim com nossas ambições de simplicidade.

Não, minha historia é singela, alheia a intervenções divinas, cataclismos, hecatombes nucleares, terroristas formulando políticas públicas de ensino. Não vou retratar a comunidade de inteligência, as mesas de operação dos bancos centrais, a ponte de comando de um porta-aviões, o fundo dragado do mar.

Minhas personagens, cegas, são duas criaturas de amor que a carne finalizou em formas femininas. Eram mãe e filha, caminhando rumo à escola para cegos, onde a filha estuda.

Iam felizes suas bastantes vidas, de humanos, de pessoas poupadas da ambição desagregadora. Iam respirando o ar de laranjeira após uma chuva delicada e operosa, finda havia pouco. Constituíam a unidade familiar e tiravam insuspeitados empregos do perfume do ar, do olor que a gostosa umidade oferecia, decorosa.      

Não eram ricas, não estavam com suas vidas garantidas, essas criaturas, mas viviam satisfeitas, haurindo o presente de cada dia que a madrugada traz embrulhado e a aurora já revela.

Eram mãe e filha, uma família, e se queriam. Essa é a historia mais simples e feliz que me ocorreu, e não quero fatigar sua precária maquinaria com tolices.

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