A caminho de Copan, depois de dois dias muito relaxantes em Utila. A viagem se encaminha.
sexta-feira, 30 de dezembro de 2011
quinta-feira, 29 de dezembro de 2011
Utila
Após uma breve passagem por Roatán, ilha lotada de americanos (precisa dizer mais?), cheguei a essa remota versao do paraíso. Por aqui passam tubaroes baleia, vindos do Mexico, mas eles nao estao aparecendo muito, nesses dias.
Divertido, o arquipélago tem a segunda maior barreira de corais do mundo. Hoje vi maravilhas dentro dágua, e a borda espetacular de um abismo.
Por do sol emoldurando a vida, hotel sobre a água: Utila barbariza.
Amanha saio cedo para o continente, para ver Copán.
segunda-feira, 26 de dezembro de 2011
Granada - Managua
Saio agora para Manágua, a capital da Nicarágua.
No meio do caminho, paradinha no mercado de Masaya, para as compras não realizadas ontem.
Conheço a cidade rapidamente e tomo o ônibus para Tegucigalpa, Honduras. A viagem se encaminha para a metade. Tenho gasto mais que o planejado, embora se consiga uma refeição honesta por dez reais. Água fresca é de graça.
O transporte público é super barato mas, às vezes, a gente pega um táxi. 200 quilômetros podem custar 7 horas ou 40 dólares, depende da sua paciência e humor. E, às vezes, custam 7 horas e 45 dólares...
domingo, 25 de dezembro de 2011
Masaya
Volto do Masaya. Muitos gases, encobrindo a cratera. Em outra, pouca atividade.
A parte mais interessante, com lava incandescente, está fechada, pelo alto risco. Assim, é provavel que eu saia da América Central sem ver esse fenômeno, tal como no Havaí.
Fomos ainda aos pueblos blancos, e comprei peças aos próprios artistas, jeito mais bacana de prestigiá-los.
No mais, chuva e um passeio às isletas, no lago Nicarágua.
Nicarágua
Cheguei a Granada, cidadezinha histórica da Nicarágua.
Hostel bacana, as pessoas me veem com a camiseta verde amarela do Brasil e sorriem: é Natal.
Saio agora para umas ilhotas formadas há 10.000 anos pelo vulcão. Depois, vou ao principal mercado de artesanato das américas, talvez, e ao vulcão Masaya, colosso de lava e fumarolas.
sábado, 24 de dezembro de 2011
Sky canopy
Vocês acharam extremo o canopi a 120 metros de altura?
Ontem fiz um de 200 metros, a 100 km/h, por 800 metros!
Trata-se de um conjunto de 8 cabos, cada qual mais insano.
A altura, a aceleração, a distância para o vale, o visual do lago Arenal, a floresta: é muito louco. Às vezes você invade o dossel, qual bala entre as árvores.
Olhando do chão, e considerando a alta frequência dos cabos, parece que caças resolveram patrulhar a floresta, com turistas desenganados a bordo.
Isso de canopi, pensei ser coisa de criança. Está entre as coisas mais extremas que já vivi.
Por tudo isso: pura vida!
sexta-feira, 23 de dezembro de 2011
Canopi
Ontem fiz canopi, experiencia de outro mundo...
Quando subimos à torre inicial, quase desisti. Nao fora os amigos holandeses, atentos a qualquer sinal de fraqueza, eu teria saido correndo dali para nunca mais.
Atado ao cabo de aço, começa a viagem, à toda. Voce percorre meio quilometro, a 120 metros de altura, a uma velocidade insana, sobre a copa e por entre as arvores. Olhando para o lado, uma cachoeira; do outro, o vale imenso, e a floresta profunda.
O medo se dissipa rápido, à medida que a adrenalina sobe. Os vales e cachoeiras se sucedem numa vertigem de verdes esplendorosos.
Viagem lindíssima.
Para fechar a noite, fui a Baldi, uma estacao termal. A agua, colhida nas profundas do vulcao, chega numa chachoeira improvável, uma torre em fumos telúricos, sinistros.
Na piscina logo abaixo, um alerta: nao nadar. Ao entrar entendi porque: a 40 graus, voce sente o vulcao nas entranhas. E ele nao esta nada satisfeito, pelo visto.
Ao cabo de um tempo, fui a uma cachoeira, para refrescar, mas aí é que o cozimento se acelerou.
Depois, a comida, ao gosto. Comi feito um retirante.
Frenético.
quinta-feira, 22 de dezembro de 2011
Arenal
Ontem devassamos a floresta, rumo ao vulcão. Após duas horas e meia montanha acima, em meio à floresta da chuva, o lanche. Lá embaixo, dentro da cratera, um lago fantasmagórico, jade ondulante, convidava.
Nadamos nesse lago congelante e sulfúrico, em busca de uma redenção turística.
Bordejamos a cratera, seu interior florestado, e subimos para alcançar o Arenal Observatory Lodge, vasto hotel situado na vegetação incentivada pelo vulcão. Serviu de base para o Smithsonian pesquisar a atividade vulcânica, e ainda abriga estação sismológica completa. É a meca para um retiro de magias. Antes, homenageamos uma cachoeira portentosa.
Ao fim, as águas quentes do Tabacón, que relaxam e fazem bem.
A floresta chuvosa tem árvores desmedidas, cobertas por musgo, orquídeas e bromélias, numa exuberância enriquecedora. O solo, dádiva vulcânica, é perfeito para a flora.
A Costa Rica, de florestas autênticas, café e frutas saborosas, é um imenso retiro de virtudes cenestésicas.
Pura vida, dizemos todos.
quarta-feira, 21 de dezembro de 2011
Pura vida
Após um voo ate a Cidade do Panamá e um ônibus tumultuário noite adentro, cheguei à fronteira com a Costa Rica, exatamente a tempo de esperar 5 horas numa fila de controle.
E, contudo, a Costa Rica é especial. Fiz rafting no rio Pacuare, um dos melhores do mundo. Arrebatador: o canion, a floresta que se debruça majestosa sobre o rio, e as corredeiras, muito inteligentes.
Subi ao vulcão Poás mas, por aqui, cada montanha, e sobretudo cada vulcão está envolto permanentemente em um véu de nuvens impenetráveis. Honestamente - pelo critério do testemunho ocular, o mais inadmissível de todos - eu não poderia afirmar que o vulcão existe, já que dele não vi a mais ínfima parte.
Então cheguei ao Arenal, pela noite. Desfrutei de um ceviche totalmente insano, talvez o melhor que já experimentei, verdadeira celebração dos sentidos.
Agora me preparo para subir as encostas do Arenal, em meio a uma absurda e festiva floresta da chuva, exuberante.
Para tudo isso, aqui se diz, forte:
Pura vida!
É o que venho dizendo, todo o tempo.
sexta-feira, 16 de dezembro de 2011
Ateísmo
Não me defino como ateu. Os outros é que são crentes, sem qualquer autorização ou arrimo. Não me defino por oposição aos outros, mesmo que tumultuosa maioria. E essa maioria quer porque quer que eu acredite na inexistência de Deus/deuses.
Não acredito, não acredito, não acredito!
O fato de Deus e os deuses não existirem, e bem assim o Saci, não me obriga a crer em sua inexistência. Deixem minhas crenças fora disso! Já as mulas-sem-cabeça são um caso à parte, tormentoso.
Hélio faz, abaixo, outra sóbria intervenção no vespeiro religioso. Matou a pau:
Não acredito, não acredito, não acredito!
O fato de Deus e os deuses não existirem, e bem assim o Saci, não me obriga a crer em sua inexistência. Deixem minhas crenças fora disso! Já as mulas-sem-cabeça são um caso à parte, tormentoso.
Hélio faz, abaixo, outra sóbria intervenção no vespeiro religioso. Matou a pau:
Basicamente, coloquei-me do lado de Daniel [Sottomaior], quando afirma que não existe algo como fundamentalismo ateu, pelo menos não se definirmos o ateísmo como a posição daqueles que não acreditam em afirmações extraordinárias como a existência de um Deus pessoal, milagres e demais violações ao que sabemos sobre a física e a lógica sem que elas se façam acompanhar de evidências palpáveis.
A palavra fundamentalismo, compreendida como uma adesão irrestrita a dogmas e crenças axiomáticas, não combina com ateísmo, porque o incréu racional se veria compelido a mudar de opinião com a apresentação de provas. Se o Criador surgisse nos céus e se comunicasse com a totalidade da população mundial demonstrando seus poderes, por exemplo. Convenhamos que, se o Deus judaico-cristão de fato existisse e tivesse apenas uma fração dos poderes que a tradição lhe atribui, não teria nenhuma dificuldade para realizar um truque desses.
Já um fundamentalista religioso é alguém que não muda de opinião, pois não há uma forma lógica possível de indicar para além de qualquer dúvida que o Deus judaico-cristão não existe. Ele é definido de modo que sempre pode escapar para os interstícios do discurso e da própria epistemologia. Ou, para colocar o problema num exemplo concreto, eu poderia demonstrar a existência de Papai Noel capturando-o e o apresentando aos céticos, mas não há como provar que o bom velhinho não existe, pois o fato de eu não encontrá-lo mesmo com séculos e séculos de busca pode significar apenas que não o procurei direito. Nesse sentido, os ateus estão do lado confortável da equação, já que, por idiossincrasias da lógica (é difícil refutar um juízo particular negativo), caberia aos religiosos provar que o Deus monoteísta existe, o que ainda não fizeram em cerca de 2.000 anos de cristianismo e 3.000 de judaísmo.
Se a questão da existência ou não de um Criador é tão elusiva do ponto de vista formal, por que a maioria da população do planeta continua, com tão pouca base concreta, acreditando em algum tipo de entidade metafísica que comanda ou pelo menos influi nos destinos dos homens?
O meu palpite, que é referendado por um número crescente de psicólogos e neurocientistas como Catherine Caldwell-Harris, Andrew Newberg, David Comings, é o de que estamos aqui lidando com diferentes estilos cognitivos. Ateus privilegiam as camadas mais externas e frontais do cérebro, além do córtex anterior cingulado, dando preferência a raciocínios lógicos e exatos, enquanto os crentes se fiam mais nos lobos temporais, confiando em suas intuições. Não é um acaso que uma resposta religiosa comum às objeções dos ateus seja: "eu sei que Ele existe".
Pessoalmente, já adotei um ateísmo mais militante. Achava que era importante expor o maior número de pessoas a ideias ateias para que elas pelo menos soubessem que é possível pensar fora do registro das religiões e chegassem a suas próprias conclusões. Continuo pensando que o debate franco é positivo, mas estou cada vez mais inclinado a considerar que o que define a religiosidade de uma pessoa é uma complexa combinação de fatores genéticos e socioculturais. Nesse contexto, a militância (seja ela do lado religioso ou ateu) se torna menos importante, pois acaba sendo uma espécie de pregação para convertidos.
É claro que, no que concerne a direitos e liberdades, tanto religiosos como ateus estão autorizados a dizer o que bem entendem. Enquanto permanecermos no reino das palavras, estamos seguindo as regras do jogo democrático. Tentar converter ou desconverter alguém é plenamente legítimo, tanto para Richard Dawkins como para os testemunhas de Jeová. E nem é preciso que os argumentos sejam bons. Só o que não pode acontecer é que saiamos do campo da semântica para adotar técnicas mais físicas de persuasão, como a censura a ideias, sob pena de prisão, e as fogueiras, que já foram utilizadas no passado. É também por aí que acho que não podemos falar em fundamentalismo ateu, uma vez que jamais ouvi falar de um que adotasse outra arma que não o discurso. Na verdade, considerando que foi só muito recentemente que conquistaram o direito de expor livremente seus pontos de vista, ateus até que fazem um uso bastante parcimonioso da palavra.
domingo, 11 de dezembro de 2011
Grão Pará
Sábia decisão, a dos paraenses neste domingo.
Não à farra com o dinheiro público; não à manipulação grosseira de Duda Mendonça, que trata o eleitor como galo de rinha; não à fantasia de que criar estados ou municípios resolve alguma coisa. Se estado pequeno fosse, por si só, garantia de desenvolvimento humano, Alagoas e Sergipe não seriam essas coisas deploráveis que vemos, no quesito.
Duda mandou dizer que o Brasil só se emancipou porque, no plebiscito encomendado por El-Rey, os portuga não foram consultados. Em minha ignorância, cheguei a pensar que o Brasil se libertou da Coroa assumindo a dívida portuguesa. Negócio de pai pra filho.
Chega de empulhação. Viva a Justiça Eleitoral, que não caiu no conto do vigário da consulta só dos separatistas. Viva a mais autêntica democracia.
sábado, 10 de dezembro de 2011
Sobre medicamentos
Marcia Angell, ex-editora-chefe do New England Journal of Medicine e professora em Harvard, escreveu um libelo incomumente direto e incisivo contra a indústria farmacêutica, particularmente a dos EUA.
Em meio à leitura estive na farmácia da esquina. Pedi loratadina 10 mg. Me ofereceram uma de marca, por algum motivo mais barata. E também uma coisa chamada desloratadina, supostamente melhor que a própria. Inocente, não?
Marcia tem algumas coisas a dizer, a respeito:
i. a indústria farmacêutica vende remédios nos EUA a preços inaceitáveis, alegando altos custos de pesquisa e desenvolvimento. Essa alegação é rigorosamente fraudulenta. A P&D de novos medicamentos é feita, quase exclusivamente, por pesquisadores e laboratórios públicos ou de universidades, à revelia e sem qualquer ajuda da indústria. Remédios inventados por esses pesquisadores, quando servem a condições médicas raras, sequer são considerados para produção, porque o número projetado de compradores é pequeno. A indústria também não gosta quando a clientela é muito pobre: por que diabos você acha que não temos vacinas/medicamentos contra dengue, malária, esquistossomose, doença do sono e outras enfermidades típicas de países pobres?
ii. Os laboratórios, em vez de inovar com medicamentos que salvariam vidas (e custariam bilhões de dólares), se especializaram em produzir medicamentos de imitação, idênticos aos em uso, mas alegando novas terapêuticas, ou nova dosagem, ou novas cores. Isso mesmo, novas cores: nos EUA, uma patente de medicamento pode proteger até mesmo uma nova cor (lilás, ao contrário daquela pílula azul, puro veneno), e isso é o bastante para entrar numa lista de proteção, editada por uma entidade privada!
iii. O que a indústria faz é gastar quantias indecentes com publicidade e compra de parlamentares, agentes reguladores, médicos e pesquisadores. É, você leu direitinho: eles compram todo mundo. O Congresso faz leis marotas, que estendem a patente com os mais bisonhos motivos e os mais bizarros resultados. Mês passado venceu a patente do Lipitor, marca de estatina, após décadas de prorrogações e uma montanha de dinheiro para a Pfizer. As leis também manietam a agência reguladora (FDA), outrora a ciosa xerife dos conluios desse monopólio, e agora uma escrava dócil dos desejos da indústria. Médicos e pesquisadores são contratados como "colaboradores", quando na verdade estão recebendo subornos, da mesma forma que (no Brasil) um candidato pode contratar milhares de cabos eleitorais, a serem pagos após as eleições, garantindo assim (ao menos) o voto dessas almas mortas.
iv. As universidades, os pesquisadores e até os NIH (laboratórios públicos dos EUA) são forçados a licenciar seus achados para a indústria farmacêutica em troca de royalties irrisórios, uma fração simbólica dos lucros bilionários. Quer um exemplo? Uma empresa pagou 35 milhões de dólares aos NIH sobre vendas de 9 bilhões de dólares do taxol. Isso depois de o governo ter gasto uma montanha de dinheiro: a) na pesquisa do medicamento (NIH); b) na compra do remédio, pelo programa Medicare.
v. Nos EUA os médicos são obrigados a uma educação continuada, ao contrário do Brasil. Parece bom, não é mesmo? Ocorre que os cursos de atualização são integralmente pagos pela indústria interessada, que impõe seus remedinhos aos médicos, inclusive com a contratação de medalhões da medicina que fingem conduzir pesquisas neutras. A coisa é tão escandalosa que os papers usados nas aulas e palestras são produzidos por essa indústria, para favorecer seus produtos. Outros materiais dirigidos aos médicos, com pesquisas sobre eficácias terapêuticas (a chamada fase IV), são produzidos por empresas de marketing, juntamente com as próprias pesquisas!
vi. Você acha que já basta? Em 2001, nos EUA, a indústria distribuiu 11 bilhões de dólares em "amostras grátis", uma das formas mais manjadas de manipulação de médicos e pacientes. Deve ser o único ramo do capitalismo que acredita em almoços grátis. Ou não? Tem mais: programas respeitados, como o 60 minutes, da CBS, transmitiram centenas de vídeos que pareciam material jornalístico, mas eram spots de anúncios de fármacos. Atores famosos também são convidados para talk shows e, "espontaneamente", mencionam problemas médicos, assim como o nome do remedinho milagroso. Sem querer, claro, mas ensaiados com o entrevistador e pagos pela indústria.
Em resumo, a indústria das drogas não inova, apenas lança imitações de medicamentos existentes. A coisa é fácil, porque ela não precisa provar que a imitação é mais eficaz do que (e nem mesmo tão eficaz quanto) o medicamento em uso. Tudo que precisa é mostrar que é melhor que nada. É até possível aprovar drogas que são piores que aquelas em uso!
Foi assim que, quando o Prozac perdeu sua patente, em 2001, e o genérico fluoxetina passou a ser vendido por uma fração do preço daquele, a Elli Lilly patenteou uma dosagem semanal, mudou a cor da pílula para rosa e lilás, renomeou-o para Sarafem e ordenou que, dali em diante, todo bom médico o prescreveria para o recém inventado "transtorno de disforia pré-menstrual". E tudo por apenas 3,5 vezes o valor da fluoxetina. Prooonto. Está feliz, leitora?
Não menos que 35% dos custos fixos da indústria farmacêutica é com marketing, inclusive a propaganda direta ao consumidor de produtos caríssimos e sem qualquer eficácia adicional sobre os genéricos, enquanto os custos com pesquisa e desenvolvimento são secretos. Eu disse secretos e, por secretos, eu quero dizer, bem, secretos.
A desloratadina que me ofereceram é apenas o metabólito da loratadina, algo em que ela se transforma no organismo. Eficaz por apenas 12 horas, e ao dobro do preço, trata-se de um assalto.
Está visto, essa indústria tem um lema: o consumidor que se...
Cuide.
Abaixo, Hélio faz uma (mais uma) defesa do bom senso e da razão. Confessadamente sou mais passional que Hélio, enxergando mais os prejuízos que os supostos benefícios da religião na história.
Quando digo religião, acorrem as regras infinitamente tristes e arbitrárias dos cultos, e os rios de dinheiro drenados dos incautos, necessários para manter as frotas de jatinhos e iates dos corretores da ignorância e ingenuidade do público.
Diz Hélio:
Já que dois amigos meus, Ives Gandra Martins e Daniel Sottomaior, se engalfinharam em polêmica acerca de um suposto fundamentalismo ateu, aproveito para meter o bedelho nessa intrigante questão. Como não poderia deixar de ser, minha posição é bem mais próxima da de Daniel que da de Ives.
Não se pode chamar de fundamentalista quem exige provas antes de crer. Aqui, o alcance do ceticismo é dado de antemão: a dúvida vai até o surgimento de evidências fortes, as quais, em 2.000 anos de cristianismo, ainda não apareceram.
Ao contrário, dogmas vão contra tudo o que sabemos sobre o mundo. Virgens não costumam dar à luz e pessoas não saem por aí ressuscitando. Em contextos normais, um homem que veste saias e proclama transformar vinho em sangue seria internado. Quando se trata de religião, porém, aceitamos violações à física e à lógica. Por quê?
Ou Deus existe e espera de nós atitudes exóticas -e inconsistentes de uma fé para outra-, ou o problema está em nós, mais especificamente em nossos cérebros, que fazem coisas esquisitas no modo religioso.
Fico com a segunda hipótese. Corrobora-a um número crescente de cientistas que descrevem a religiosidade ou sua ausência como estilos cognitivos diversos. Ateus privilegiam a ciência e a lógica, ao passo que crentes dão mais ênfase a suas intuições, que estão sempre a buscar padrões e a criar agentes.
Posta nesses termos, fé e ceticismo se tornam um amálgama de influências genéticas e culturais difícil de destrinchar -e de modificar.
Como bom ateu liberal, aplaudo avanços no secularismo, já que contrabalançam o lado exclusivista das religiões, que não raro degenera em violência e obscurantismo. Mas, ao contrário de colegas mais veementes, acho que a religião, a exemplo do que se dá com filatelia, literatura e sexo, pode, se bem usada, ser fonte legítima de bem-estar e prazer.
domingo, 4 de dezembro de 2011
sexta-feira, 25 de novembro de 2011
Consumismo, parte 2
A semana trouxe algum consumismo, no Paraguai. Demitido pela minha lavadeira, despertei a lava roupas dos barulhinhos. Trazia comigo o manual, que resolvi não ler, e não tive problemas, exceto a opção lavagem manual.
"Como assim? Essa máquina realmente espera que eu lave as roupas, enquanto ela só observa?", protestei, em plena lavanderia platônica mobilizada. Outro problema: os insumos.
Você já viu o preço do alvejante sem cloro?
Isso de alvejantes, digo apenas que, caso eu me decida pelo lucrativo negócio do assalto a residências (como almejo), não tolerarei nada que não seja o alvejante sem cloro. Já até imagino o diálogo:
[família confinada ao quarto da empregada e arma apontada, tudo de boa, sem violência]:
– Aí tens: jóias, os relógios H.Stern e Tag Heuer, dólares, euros, os poemas...
– Mas meu Deus do céu! Acaso agora é proibido conduzir decentemente um assalto, como se espera de um bom cristão? Vou perguntar só mais uma vez: cadê o alvejante?
– Que alvejante?
– O alvejante sem cloro. Tá querendo me iludir com seus dólares e euros? Outra coisa: fique com seus poemas!
Bem, nas próximas semanas mando noticias dessa nova aventura: lavar roupas.
Obs: comprei um ipod, que há horas luta, na janela atrás desta, para sincronizar minhas oito mil músicas.
sábado, 19 de novembro de 2011
O púlpito
Proferi
algumas palavras, que pretendi edificantes: raras, ou uma xaropada, a platéia
evadiu-se, sonida. Não estou informado das novidades do evangelho, ignoro as
boas novas.
Desagradou-lhes
algo, não sei. Naquela tarde tudo me condenou, exceto um cão, que aceitou parte
do lanche.
Seja
como for, não desperdicei a chance. Gabei o ócio, investi no lazer, arrisquei
uma defesa - precária - da amizade, mas também nisso resultei inconvincente. As
pessoas até defendem a amizade, desde que as deixemos em paz.
Comecei
discorrendo sobre o altruísmo, as vantagens de ajudar o próximo, os deleites de
ser bonzinho o tempo todo, mas, atento às inclinações da platéia, fui
incorporando algum individualismo, até finalmente aceitar a tese de que
deveríamos ser livres para não termos seguros de saúde e previdência; ou
dirigirmos carros sem freios e cintos de segurança.
Contra o cigarro
Drauzio Varella escreve um libelo contra o cigarro, e sua indústria criminosa, na Folha de hoje. O tabaco encetou uma das campanhas publicitárias mais bem-sucedidas da história, com um rastro de (ao menos) 100 milhões de mortos, mais do que as primeira e segunda guerras mundiais, somadas.
E isso porque nossas decisões (inclusive as de consumo e estilo de vida) são influenciadas por fatores arbitrários, irrelevantes e - principalmente - alheios à nossa consciência ou o que julgamos ser nossos valores.
Médicos já estrelaram publicidade de cigarro (promovendo-o!) e, no início do movimento feminista, a indústria aproveitou para vender os cigarros da liberdade. Isso mesmo, cigarros "da liberdade".
Lembro de meus tempos de faculdade, quando tinha de conviver com fumantes em plena aula, assim como no ambiente de trabalho. Essa nossa moçada ingênua continua obedecendo à indústria do tabaco, continua morrendo, só que agora faltam-lhes desculpas.
A posição frente ao tabaco era meu único ponto de discórdia com Hélio Schwartsman, o mais lúcido articulista do país, por suas posições excessivamente permissivas, tal como eu via. Mas notei que Hélio deixou de lado certo academicismo libertário, e passou a olhar a coisa como ela realmente é: a infame guerra dessa indústria contra nossas crianças. Nossas crianças!
Diz Varella:
O cigarro é o mais abjeto dos crimes já cometidos pelo capitalismo internacional. Você acha que exagero, leitor? Compare-o com outros grandes delitos capitalistas; a escravidão, por exemplo: quantos viveram como escravos?
E quantas crianças, mulheres e homens foram escravizados pela dependência de nicotina desde que essa praga se espalhou pelo mundo, a partir do início do século 20? O primeiro crime foi perpetrado contra algumas centenas de milhares de pessoas; o segundo contra mais de 1 bilhão.
Na história da humanidade, jamais o interesse financeiro de meia dúzia de grupos multinacionais disseminou tantas mortes pelos cinco continentes: 5 milhões por ano - 200 mil das quais no Brasil.
Faço essas reflexões por causa de uma série que estamos levando ao ar no Fantástico, da TV Globo, com o objetivo de dar força aos que pretendem parar de fumar.
Para escolher os personagens, pedimos aos espectadores que nos enviassem vídeos explicando por que razões pediam ajuda para livrar-se do cigarro.
As cenas são dramáticas. Mulheres e homens de todas as idades que se confessam pusilânimes diante do vício, incapazes de resistir às crises de abstinência que se repetem a cada vinte minutos.
Mães e pais cheios de remorsos por continuar fumando apesar do apelo dos filhos; avós que se envergonham do exemplo deixado para os netos; doentes graves que definham a caminho da morte sem conseguir abandonar o agente causador de seus males.
Em 22 anos nas cadeias, adquiri a convicção de que a nicotina causa a mais devastadora das dependências químicas. Largar da maconha, da cocaína e até do crack é muito mais fácil: basta afastar o dependente da droga, da companhia dos usuários e dos locais de consumo.
Em contrapartida, a vontade de fumar é onipresente; mesmo sozinho, num quarto escuro, o corpo abstinente suplica por uma dose de nicotina.
No antigo Carandiru, vi destrancar a porta de uma solitária, na qual um homem havia cumprido trinta dias de castigo. Com as mãos a proteger os olhos ofuscados pela luz repentina, dirigiu-se ao carcereiro que acabava de libertá-lo: "me dá um cigarro pelo amor de Deus".
Cerca de 75% dos fumantes se tornam dependentes antes dos 18 anos; muitos o fazem aos 12 ou 13, e até antes. Somente 5% começam a fumar depois dos 25. Por esse motivo, a Organização Mundial da Saúde classifica o tabagismo no grupo das doenças pediátricas. Conhecedores das estatísticas, os fabricantes fazem de tudo para aliciar as crianças. Quando tinham acesso irrestrito ao rádio e à TV, associavam o cigarro à liberdade, ao charme, ao sucesso profissional e à rebeldia da adolescência.
Hoje, espalham pontos de vendas junto às escolas, com os maços coloridos expostos ao lado de balas e chocolates nas padarias e das revistas infantis nas bancas de jornal.
Por que razão brigam tanto para patrocinar shows de rock e corridas de Fórmula 1? Seria simplesmente para aprimorar o gosto musical e incentivar práticas esportivas entre os jovens?
Que motivos teriam para opor-se visceralmente à Anvisa, quando pretende proibi-los de acrescentar substâncias químicas que conferem ao cigarro sabores de chocolate, maçã, menta ou cereja?
Existiria outra explicação que não a de torná-lo menos repulsivo ao paladar infantil?
Qualquer tentativa de conter a epidemia de fumo através da legislação é combatida com as estratégias mais covardes por lobistas, deputados e senadores a serviço da indústria. Na contramão do que deseja a sociedade, pressionam até contra a lei que proíbe fumar em bares e restaurantes.
O que esses senhores ganham com essa conduta criminosa? Estariam apenas interessados no destino das 180 mil famílias que trabalham nas plantações ou nas doações dos fabricantes?
Nós temos o dever de impedir o crime continuado que a indústria do fumo pratica impunemente contra as crianças brasileiras. Fumar não pode ser encarado como um simples hábito adquirido na puberdade. Hábito é escovar os dentes antes de dormir ou colocar a carteira no mesmo bolso.
O cigarro deve ser tratado como o que de fato é: um dispositivo para administrar nicotina, a droga que provoca a mais torturante das dependências químicas conhecidas pelo homem.
terça-feira, 15 de novembro de 2011
Recreação de Deuses
O mar emite montanhas
6.10.11.
gráceis, gentis, necessárias.
Gigantes se
freqüentam
recreiam.
Em nós, a alta nota da alegria,
a acrobática nota da felicidade.
A emissão de montanhas pelo mar
inaugura sorrisos, pronto enriquece.
O baile aéreo de cetáceos
descreve poemas heróicos,
compreensões acontecentes.
A emissão de montanhas pelo ar
comove, pronto desrealiza.
Sobem aos céus montanhas.
Navegamos febris, incréus.
Baleias abotoam mar e céu,
conciliam esses dois azuis,
cosem nossos corações, abalados.
Serão as fundações do mundo robustas
para suportar um tal transporte,
tamanhamente aparelhado?
O tráfego aéreo de baleias,
escândalo mais propício, compreende
lançamento, sorriso e splash.
Canoras baleias juram os céus
sonoras sereias alçam aos céus.
Fluidas, oscilam de um a outro azul.
O colorido do canto sobre abismos,
que calam sob o indizível.
Não indagamos da necessidade desse
aditamento. Só vivenciamos o lucro.
Salta depressa negro granito.
Urgente, com sua antigravidade,
absolve-nos das interdições da vida.
O que querem, a quem pertencem
esses titãs, ora denunciados?
Às nuvens, à música, ao mar?
Esse pertencimento, glorificado, transcende
a compreensão íntima, que apenas ensaiamos.
Os emissários do mar
com poderes ganham os céus
num acreditamento de sonhos
para a nossa comunhão definitiva.
O aparelhamento do mar, do ar
induz altas notas de alegria
banhos de felicidade.
Consumado em sonhos,
bradei às baleias cantantes,
e foi como se um rochedo
sentenciasse himalaias.
Ainda não terminei de acreditar
no que elas me disseram.
segunda-feira, 14 de novembro de 2011
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